Diaconado: existência martirizada sem reconhecimento?

Diaconado: existência martirizada sem reconhecimento?

Diác. Gonzalo Eguía
Coordenador de Servir nas periferias
Bilbau, Espanha, 1 de janeiro de 2022

Há seis dias celebramos a festa de São Estevão diácono e protomártir, a felicitação que por este motivo nossa Redação publicou, inclui o último parágrafo da crónica – “Reflexão a partir do contexto atual”-, que Francisca Abad Martín fez sobre o protomártir, terminava desta maneira: “São Estevão torna-se também aquele diácono emblemático no qual todos aqueles que atualmente cumprem esta missão ministerial na Igreja e de quem quase ninguém se lembra”.

Envolvidos nesta época de Natal, as palavras de Francisca sugeriam duas perguntas: Podemos afirmar que os diáconos com seu ministério são um reflexo do testemunho de martyria como São Estevão? É verdade que quase ninguém se lembra do ministério diaconal?.

Se atendermos ao significado da palavra mártir: “ Morte ou sofrimentos que são sofridos por acreditar numa doutrina ou defendê-la, especialmente se for religiosa”, ninguém pode ser obrigado a realizar o ato heroico de dar ou perder a vida num ato tormentoso, ato que além disso implica uma total ação de Deus, mais que um esforço humano.

Mas seguir Jesus Cristo, por parte de qualquer pessoa batizada, se isso implicar uma visão de martírio da própria vida, uma entrega quotidiana, progressiva, uma experiência vital de “ expropriação” da vida em favor dos outros, que em certos momentos concretos produz sofrimentos, nesse sentido pergunto-me !? Podemos como diáconos afirmar que o exercício de nosso ministério tem esta dimensão de martírio? É possível viver o ministério diaconal sem perceber esse “martírio” quotidiano?

Como na vida de São Estevão, o exercício do ministério diaconal exige-nos que respondamos com valentia como seguidores de Jesus, servindo no meio familiar, da igreja, da sociedade e do mundo. Neste sentido o sentimento de “expropriação” em favor dos outros gera, provavelmente o resultado da maturidade e da generosidade da dedicação, uma dupla vivência: um certo sofrimento por ter de colocar à frente de seus próprios interesses aqueles que, por qualquer razão necessitam de ser atendidos, acompanhados, apoiados na recuperação de sua dignidade… em qualquer caso amados, mas também, a satisfação que produz saber que em certo momento e lugar adequado estiveste diante de quem de ti precisava, essa vivência de que a vida é para ser oferecida em serviço.

O sofrimento de martírio que é vivido na família é assumido como algo inerente ao ministério sagrado da educação e o crescimento pessoal no ambiente familiar. O sofrimento gerado no meio social e no mundo supõe uma união decisiva com Jesus Cristo, um discernimento diário para entender como o Senhor deseja que atuemos no meio deste mundo, em todas as relações humanas e sociais, tendo consciência de que em muitas ocasiões será necessário remar contra a corrente em mares agitados e turbulentos.

Ás vezes os diáconos experimentam um sofrimento especial, que é gerado dentro da comunidade eclesial, quando depois de um discernimento evangélico adequado, passamos a responder às pessoas que menos contam, às últimas e o ser incompreendido por alguns de seus irmãos e irmãs da comunidade. O sofrimento é maior quando essas ações implicam uma repulsa na recuperação da dimensão diaconal de toda a Igreja e percebe-se que as palavras andam para um lado e as ações para outro.

Também é verdade que quando o discernimento é comunitário, esse sofrimento é menor, ou pelo menos tem um horizonte mais esperançoso, vale dois exemplos simples desta última semana em que celebramos o nascimento de Jesus Cristo para ilustrar essa dupla experiência: uma pessoa que faz atendimento na sacristia de uma paróquia dizia-me: “ eu removi o cartaz da campanha da Cáritas deste Natal, porque mancha a nova toalha de mesa que colocamos no altar”, pensei para mim o que teria feito de mal nestes anos em que sou diácono nesta paróquia ? Uns dias depois uma avó de outra comunidade dizia-me “ conta comigo para o lugar de acolhimento de emigrantes nos locais que não são usados na paróquia, pois isso é o que Jesus deseja e o que nos é pedido pelo Papa Francisco”.
Outra pergunta permanece no ar: é verdade que quase ninguém se lembra do ministério diaconal? Há um sentimento agridoce na resposta. Como diáconos comentamos entre nós as experiências que presenciamos nas nossas comunidades, e, sempre há coincidências na alegria que sentimos quando o ministério diaconal está presente nelas. É certo que sempre há problemas e tensões, mas em geral os diáconos sentem serem acolhidos e reconhecidos pelos membros das comunidades, nas quais formamos parte, igualmente também por parte dos bispos e presbíteros. Este agradecimento tem por vezes manifestação implícita, outras vezes, de forma explícita, manifesta-se a riqueza que a presença do serviço de um diácono, na maioria das vezes casado. Faltaríamos à verdade ao dizer que ninguém se lembra do ministério diaconal.

Outra questão é se em outras esferas eclesiais o ministério diaconal é reconhecido ou “ ninguém se lembra” da sua presença. É difícil para nós diáconos responder a esta pergunta. Custa-nos porque fomos ensinados a passar despercebidos no desenvolvimento do ministério, para servir sem qualquer reconhecimento, ao estilo do Senhor, e este objetivo é totalmente evangélico e orientador do ministério diaconal. Mas também é certo que em muitas ocasiões, em planos eclesiais da Igreja universal ou das igrejas locais, em celebrações litúrgicas e em homilias, em programas pastorais aonde há diáconos intervindo, em… não se encontra nem uma só referência ao ministério diaconal. Quando isto sucede o mecanismo mental supõe, por um lado, reativar a humildade própria do ministério, e, por outro, desejar que o ministério diaconal esteja mais integrado na pastoral de conjunto, junto ao resto de serviços e ministérios da Igreja. Quando algo não se anuncia pode dar a sensação de que não existe, uma coisa é viver a humildade e outra é “lembrar” de que o ser do ministério diaconal é promover, ao ritmo do Espírito, a dimensão diaconal da Igreja.

Hoje a Igreja celebra a 55ª Jornada Mundial da Paz, por esta razão publicamos a Mensagem que o Papa dirigiu com este motivo sob o título “Diálogo entre gerações, educação, trabalho: instrumentos para construir uma paz duradoura”. Anexamos também o Discurso do Papa Francisco à Cúria Romana por altura da saudação de Natal, de interesse para essa cúria e para todas as cúrias diocesanas.

No Brasil foi inaugurado, o Santuário de Maria Rainha, de Garanhuns, o monumento ao diácono com processo de beatificação João Pozzobon. Nesse mesmo país foi realizada a primeira Assembleia diaconal da arquidiocese de Paraíba, assim como o Encontro vocacional ao diaconado permanente na arquidiocese de Vitória.

Do Paraguai chega-nos a notícia da ordenação de 31 novos diáconos. Junto a estas ordenações, neste último mês do ano foram celebradas muitas mais e muito numerosas: no Brasil destacam-se os 20 ordenados da arquidiocese de Belo Horizonte, os 16 da diocese de Santo André. Em Costa Rica os 6 ordenados da diocese de San Isidro, ou os 6 da arquidiocese de Miami nos EUA.

Publicamos a crónica escrita pelo diácono Aurelio Ortín sobre o XXXVI Encontro de diáconos das dioceses espanholas. Deste país recebemos também um artigo de Montserrat Martínez sobre a “Relação bispo-diácono. Memória e oração pelo arcebispo cardeal Jubany”,no aniversário de quem foi um dos promotores da recuperação do ministério diaconal permanente depois do Concílio Vaticano II.

Na secção de “diaconias” é relatada a nomeação como chanceler da cúria da arquidiocese de Santa Maria no Brasil.

Na área “ Conhecendo uma escola diaconal” proporcionamos as características da Escola “San Lorenzo” da arquidiocese de Medellín na Colômbia.

Foi publicado o livro “O apostolado do mar, uma pastoral de Igreja em saída” do diácono de Barcelona – Espanha – Ricard Rodríguez -Martos, fruto de sua experiência na Delegação diocesana do Apostolado do Mar.

O diácono português Joaquim Armindo continua com suas habituais colaborações, e, o diácono chileno Miguel Ángel Herrera Parra traz uma nova série de novos poemas.

As comemorações do 50º aniversário da ordenação continuam a ocorrer, neste caso o do diácono chileno Carlos Rojas.

Ao começar este novo ano de 2022, desejamos a todos aqueles que habitualmente leem Servir nas periferias, a suas famílias e comunidades, a experiência alegre de viver um ano na presença de Deus e no serviço aos irmãos e irmãs, vale a pena expressar este desejo com as palavras que São Gregório de Nisa uniu á memória do Natal – Deus connosco – e a São Estevão – uma vida para o serviço -:
“Olhai, amados ! Celebramos uma festa depois da outra. Ontem o Senhor do Universo deu-nos alimento, e hoje o seguidor de Cristo alimenta-nos. Como é isto? Cristo baixa até nossa humanidade, Estevão sobe até Cristo. Cristo entra no vale da vida, Estevão saiu dela. Cristo foi envolvido em fraldas pelos homens, e Estevão foi coberto de pedras por Cristo”.

Em nome da Equipa Coordenadora e de Redação, um abraço fraterno .

Gonzalo Eguía

 

Tradução do original: Diacono Mario Henrique Pinto

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