Catedral de Sant’Ana – Mogi das Cruzes – 06 de janeiro de 2018
Foram ordenados: Benízio Maria Silva, César Paulino, José Aparecido Marchi, José Roberto de Queluz, Mário Vieira, Nilton Sérgio Consoleti, Paulo Aparecido Rosa e Ramiro Rodrigues de Santana Neto.
“Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12)
A ordenação de oito diáconos permanentes, no início desse ano, se apresenta como mais um momento abençoado para a Diocese de Mogi das Cruzes, que acaba de completar cinqüenta e cinco anos de sua instalação. Com esses, completa-se o número de vinte e sete diáconos permanentes na diocese, completando em cem, o número dos diáconos que ordenei nos dezesseis anos de ministério episcopal.
“Amai-vos uns aos outros” (Jo 15,12.17), disse Jesus, tendo dito também que no amor a Deus e no amor ao próximo estão contidos a Lei e os Profetas. O mandamento do amor é quase que o resumo da pregação de Jesus. Ao proclamá-lo com ênfase, Jesus aponta o efeito que a prática do amor produz na vida do discípulo, e o faz como que em forma de bem-aventuranças: quem ama permanece n’Ele e participa da sua plena e verdadeira alegria, própria daqueles que, como Cristo, são capazes de dar a vida pelos que amam. No amor, o discípulo torna-se amigo de Cristo e o segue pela vida produzindo frutos em favor da humanidade.
O amor de que fala Jesus é o “ágape”. Bento XVI, na carta encíclica Deus caritas est (25.12.2005)distingue de modo preciso os diferentes aspectos do amor: eros, filia e ágape. O amor de Deus de que Cristo fala é o ágape, traduzido por caridade. O ágape-caridade é a prática da Igreja enquanto “Comunidade de Amor”, visto que a caridade da Igreja é a manifestação do amor trinitário. Bento XVI cita Santo Agostinho: “Se vês a caridade, vês a Trindade” (DCE 19). Queridos filhos, logo mais diáconos, também o convite da ordenação cita Santo Agostinho: “A medida do amor é não ter medida”.
O serviço da caridade na Igreja
Na prática da Igreja, a caridade se transforma cotidianamente em perseverante serviço. “Permanecei no meu amor” (Jo 15,9), disse Jesus. Permanecer no amor do Senhor significa, concretamente, viver na Igreja, a vida do Espírito. De fato, “o Espírito é aquela força interior que harmoniza os corações dos crentes com o coração de Cristo e leva-os a amar os irmãos como Ele os amou, quando se inclinou para lavar os pés dos discípulos (cf. Jo 13, 1-13) e sobretudo quando deu a sua vida por todos (cf. Jo 13, 1; 15, 13)” (DCE 19).
Continua o Papa emérito: “toda atividade da Igreja é manifestação dum amor que procura o bem integral do ser humano: procura a sua evangelização por meio da Palavra e dos Sacramentos …; e procura a sua promoção nos vários âmbitos da vida e da atividade humana. Portanto, é amor o serviço que a Igreja exerce para acorrer, constantemente, aos sofrimentos e às necessidades, mesmo materiais, dos seres humanos” (cf. DCE 19).
A caridade faz parte da “natureza íntima da Igreja” e exprime-se num tríplice dever: anúncio da Palavra de Deus (kerygma-martyria), celebração dos Sacramentos (leiturgia) e serviço fraterno (diakonia). São deveres que se reclamam mutuamente, não podendo um ser separado dos outros. Para a Igreja, a caridade não é uma espécie de atividade de assistência social que se poderia mesmo deixar a outros, mas pertence à sua natureza; é expressão irrenunciável da sua própria essência (cf. DCE 25).
Consequentemente, a caritas-ágape estende-se para além das fronteiras da Igreja; a parábola do bom Samaritano permanece como critério de medida, impondo a universalidade do amor que se inclina para o necessitado que se encontra pelo caminho (cf.Lc 10, 31). A começar pela própria Igreja, enquanto família, nenhum membro deveria sofrer passando necessidade (cf. DCE 25), visto que o amor dos irmãos virá em socorro, promovendo o auxílio fraterno.
O serviço da caridade do diácono
A caridade é o dever da Igreja. E, para cumprir tal dever, ela necessita de missionários da caridade, apóstolos do serviço aos pobres, ministros instituídos na Igreja em função da diakonia. A Igreja, comunidade de amor, presta um serviço organizado, como no-lo ensina o livro dos Atos dos Apóstolos, ao afirmar que os cristãos tinham tudo em comum e que, no seu meio, já não havia diferença entre ricos e pobres (cf. At 4, 32-37). Os primeiros cristãos dão o testemunho de que “no seio da comunidade dos crentes não deve haver uma forma de pobreza tal que sejam negados a alguém os bens necessários para uma vida condigna” (DCE 20).
Foi para que assim acontecesse, que os apóstolos, já no início da Igreja, escolheram sete homens “cheios do Espírito Santo e de sabedoria” (At6,1-6) para um serviço social concreto, mas ao mesmo tempo um serviço espiritual; tratava-se, na verdade, de um ofício verdadeiramente espiritual (cf. DCE 20). Desse modo, com a escolha dos sete diáconos, a diakonia – que é o serviço do amor ao próximo exercido comunitariamente e de modo ordenado – estava instaurada na estrutura fundamental da própria Igreja. Os Atos dos Apóstolos afirmam que os diáconos são escolhidos por serem “homens de boa fama, repletos do Espírito e de sabedoria” (At 6,3), como Estêvão, “homem cheio de fé e do Espírito Santo” (At 6,5).
Tudo isto reza a oração consecratória da ordenação, que logo mais será proferida, ao afirmar que, nos ministros ordenados, devem resplandecer “as virtudes evangélicas: o amor sincero, a solicitude para com os enfermos e os pobres, a autoridade discreta, a simplicidade de coração e uma vida segundo o Espírito”.
“Servir às Mesas”
Na segunda leitura, retirada dos Atos dos Apóstolos, ouvimos como os Doze encarregaram os primeiros diáconos com uma tarefa muito específica: “servir às mesas”. Mas de que mesas fala o Apóstolo Pedro?
Como foi afirmado anteriormente, o serviço da caridade que os futuros diáconos permanentes deverão exercer exprime-se num tríplice dever: o anúncio da Palavra de Deus, a celebração dos Sacramentos e o serviço da caridade. Está aqui, em suma, o cerne da missão dos diáconos que, entre os ministros, são ordenados “não para o sacerdócio, mas para o serviço” (Lumen Gentium, 29). O diácono, pois, tem a missão recebida dos Apóstolos de servir à Mesa da Palavra, à Mesa da Eucaristia e à Mesa dos Pobres.
Serviço à Mesa da Palavra. Com o termo grego martyria que significa “testemunho” a Igreja deseja recordar, queridos filhos, a relação profunda que vocês deverão estabelecer com a Palavra de Deus. Com efeito, quando receberem o Livro dos Evangelhos durante o Rito de Ordenação, vocês ouvirão a bela exortação: “transforma em fé viva o que leres, ensina aquilo que creres e procura realizar o que ensinares”.
Como nos recorda o Apóstolo São Paulo: “Ai de mim se eu não evangelizar!” (1Cor 9,16). O mero anúncio da Palavra da Salvação pode não ser suficiente para penetrar o coração das pessoas. É preciso que o anúncio seja acompanhado do testemunho de vida – da martyria.
Serviço à Mesa da Eucaristia. A primeira leitura, extraída do Livro dos Números, discorreu sobre o ministério dos levitas, aos quais o Senhor confiou o cuidado com o culto na Tenda da Reunião. Na Oração Consecratória, a Igreja afirma que os diáconos escolhidos pelos Apóstolos realizam aquilo que era anunciado em sombras através do ministério levítico. Desta forma, os diáconos são também constituídos como ajudantes e servidores daqueles que participam ministerialmente no sacerdócio de Cristo, a saber, os Bispos e os Presbíteros (cf. Catecismo da Igreja Católica, 1554). Por essa razão, aos diáconos – como ministros da Liturgia e do Altar – é permitido “proclamar o Evangelho, preparar o Sacrifício e repartir entre os fieis o Corpo e o Sangue do Senhor; … administrar o Batismo, assistir e abençoar os Matrimônios, levar o Viático aos agonizantes e oficiar as Exéquias” (Homilia do Pontifical Romano). Sejam, pois, amados filhos, zelosos para com tudo aquilo que diz respeito ao culto divino, mormente o Santo Sacrifício da Missa pelo qual eminentemente se perpetua no mundo a ação salvadora de Cristo Jesus.
Serviço à Mesa dos Pobres. Por fim, é tarefa premente dos diáconos o serviço aos pobres, para os quais Nosso Senhor reservou um lugar tão especial no plano da salvação. A mensagem do Tempo do Natal, ainda em curso, proclama que foi aos pobres que Deus enviou seu Anjo para anunciar o nascimento de Jesus. Foram os pobres pastores os primeiros a adorar o Menino-Deus e, em seguida, anunciar a Boa Nova. Jesus teve nos pobres os destinatários preferenciais do seu amor e da sua misericórdia.
Caros eleitos, vocês que, à semelhança de Cristo, tornam-se servidores, olhem com predileção evangélica para os pobres e necessitados, presidindo e desenvolvendo em seu favor ações caritativas que visem minorar seus sofrimentos e reintegrá-los, na medida do possível, à sociedade. Cristo se fez pobre para nos enriquecer com sua pobreza (2Cor 8,9). Como São Francisco de Assis, nos pobres, vocês encontrarão o próprio Cristo.
Queridos irmãos e irmãs, pela intercessão da Virgem Maria, a partir de cuja humildade o Todo-poderoso realizou grandes coisas, e de Sant’Anna, padroeira da Diocese, elevemos nossos corações aos céus e rendamos graças a Deus pelo grande dom que estes oito eleitos representam para a nossa Igreja Particular. Que o Senhor os abençoe e os faça dignos imitadores do seu Filho que não veio para ser servido, mas para servir (cf. Mt 20,28). Amém.
Dom Pedro Luiz Stringhini
Mogi das Cruzes, 06 de janeiro de 2018.