O celibato é obrigatório nos países latinos e na Igreja Católica Romana para os presbíteros, religiosos e religiosas. Também o é para os diáconos, se forem solteiros ficam obrigados ao celibato, se forem casados, continuam casados, mas nunca podem contrair outro matrimónio. O que se torna obrigatório é que não exista nenhuma afetividade sexual. A sexualidade é que está em jogo nesta obrigação de serem solteiros. Assim – diz-se -, para se viver a plenitude de Deus é preciso que não exista afetividade sexual. Onde, porém, existe afetividade sexual? Em qualquer homem, em qualquer mulher, existe a afetividade sexual. Esta não escolheu os presbíteros para não terem afetividade sexual, porque ela é inerente a todo o ser humano.
Mesmo se dizendo que assim, o ser celibatário, é melhor para servir todo o povo de Deus. Não é isso que se passa. Temos exemplos em tantas tradições cristãs – inclusive ligadas ao catolicismo romano -, em que tal não se torna obrigatório. O ser casado em nada se contrapõem ao sacerdócio. Talvez seja o contrário: sendo casado a afetividade sexual é exercida pelo que as outras afetividades ou sentimentos são necessariamente melhor amadurecidas. Também – é verdade -, existem sacerdotes ou não, que não são casados e nem por isso deixam de ser homens e mulheres de corpo inteiro.
Mas vamos ao princípio. Na narrativa da criação do mundo relatada em Génesis (capítulos I e II), o que nos é contado é que Deus, o Criador, criou o Universo, os “luzeiros”, o sol e as estrelas e a lua. E vim que tudo era bom. Criou todas as plantas e animais e viu que tudo era bom. Criou então o Homem, mas viu-o só e disse que queria criar a Mulher, e criou. E disse, ide cuidai da Terra e multiplicai-vos. Não existe multiplicação sem sentimento sexual. Então o pecado não é a sexualidade. O grande problema foi não saber cuidar da Casa Comum, aqui residiu o pecado original originante. E seguiu-se o pecado original originado. O mesmo podemos ler em outros mitos de origem paralelos a este: Mali, Fulani;Pan Gu e a Criação, Gilgames, A Mulher que criou a Terra (Iroqueses); e muitos, muitos outros.
A afetividade sexual onde começa e onde acaba é um dilema que se coloca na realidade que vivemos. Será que o beijo é sexualidade, no ocidente um homem dar um beijo a uma mulher é normal, um cumprimento. Mas não deixa de ser um contacto sexual, ou um início de um contacto sexual. Os nossos sentidos recetem-se, quer sintamos ou não, da atratividade que um outro ser humano tem com outro ser humano. Será que um sacerdote não pode beijar ninguém? Não é isso, é o conceito que temos deste contacto, que nos faz vibrar como um todo ou não.
Não é pecado a relação sexual, nem se é menos ou mais virgem por a ter. Repare-se que se a “virgindade” fosse redutível a ter ou não uma relação sexual, seria martirizar o que é a virgindade. Ser “virgem” significa ser despojado e estar ao serviço dos outros, no Outro. Uma doação plena e total, que não exclui a família. Ser virgem com família, é de uma admiração extraordinária aquilo que é possível ver Deus no outro, e ser para ele, e Ele, de um profundo significado de entrega. Mas quem se quer entregar a Deus de outro modo, é também admirável a força necessária para superar os sentimentos inerentes ao género humano.
Não vou falar aqui se Pedro era casado ou não, ou se o significado de “sogra” de que fala a Palavra de Deus, era outro à época.
O papa Francisco compreende muito bem esta questão, e no seu admirável episcopado de Roma convoca o Sínodo Pan-Amazónico, onde não será por acaso, que coloca a questão da ordenação de sacerdotes casados. Em todo o mundo existem “falta de vocações” – como se diz – os sacerdotes (presbíteros) escasseiam, mas, curiosamente, os diáconos são cada vez mais. Poderemos tirar alguma conclusão disso. Talvez!
Quantos agora diáconos não estariam predispostos a ser ordenados presbíteros. Com formação e sobretudo com doação. O que seria uma valia considerável para a Igreja e para o mundo.
Aqui fica a reflexão!
Joaquim Armindo – Diácono da Diocese do Porto – Portugal