DIÁCONOS EM SINODALIDADE
Já me referi aqui uma vez ao Concílio de Jerusalém, o primeiro que reuniu os representantes dos amigos e amigas de Jesus, que necessitavam de refletir por onde ir. Naqueles tempos existiam questões que, naturalmente, teriam que se resolver, nos vários aspetos das vidas quotidiana. Assim nos indica o capítulo 15 dos Atos dos Apóstolos, que elas e eles receberam Paulo, enviado de outras comunidades, para debater um assunto, que queriam ver resolvido, no ambiente vital de Espírito Santo. Não sabemos quantas pessoas estariam presentes, mas que um bom lote delas lá estariam. Agora, ainda não sei se posso falar em Apóstolo Paulo, naquela altura. Tinha sido batizado, era conhecedor suficiente das leis e da pregação de Jesus, não sei, porém, se naquela altura seria considerado Apóstolo. Se o fosse, talvez estariam 13 apóstolos, contando com Matias e Paulo, e os outros 11. E estavam os Anciãos e, certamente, aqueles que os apóstolos tinham sido indicados pelos Apóstolos, como Diáconos. E diz o relato “toda a Igreja” lá estava. Foi uma discussão dura, com várias posições sobre a complexa questão da circuncisão, mas chegaram a uma conclusão.
Diríamos que o conclave reunido, sob inspiração do Espírito do Senhor, começou o caminho da sinodalidade. O caminho do avanço da Igreja no entendimento das culturas e dos seres dos povos, na escuta permanente e na decisão sinodal.
A sinodalidade não é uma reunião, mas um caminho para seguir a Jesus nos seus sinais, que estão presentes nos sinais da história. Parece que chegamos a um ponto de análise do que é o “dogma”, e, neste caso, o dogma da infabilidade papal, não há muitos anos proclamado. Penso que haverá que reler o dogma à luz da sinodalidade. O “dogma” do Concilio de Jerusalém de que não era necessária a circuncisão para seguir Jesus, não foi ditado por um deles, mas, e de acordo, com o texto bíblico, foi católico, e dentro de uma cultura prevalecente em várias das regiões onde a Nova do Evangelho era proclamada.
Hoje não tem sentido absolutamente nenhum, a não ser que alguém o queira ressuscitar. Quer esta decisão do Concílio de Jerusalém, ou mesmo no ano 90 d.C., quando o papa Clemente I, interveio em Corinto ou quando Pio IX, em 1870, no Concilio do Vaticano I, assumiu a infabilidade papal, têm de ser lidas no tempo, não mascarando o tempo de hoje com a mesma interpretação.
Importante se torna lembrar que S. Vicente de Lerins, no século V, declarava que “católico” é aquilo aceite por “todos e em toda a parte”, um misto de universal – geográfico e da história- contínua, desde o princípio dos tempos. Por isso “católico” rima com “sinodalidade”, e não com partes dessa sinodalidade, e se não for assim não é um “depósito da fé”, mas uma determinada ação, para determinado tempo, que possui, naturalmente, estruturas sociais, culturais, económicas e políticas, influenciadoras de determinadas decisões; algumas delas levaram a cismas, ainda não curados. E que só o serão quando cada um de nós nos encontrarmos com Jesus, morto e ressurreto.
Aparece nestes tempos com acuidade o termo “sinodal”, aquilo em que todas as cristãs e os cristãos, intervêm e têm voz e vez. O percurso de cada comunidade cristã, das suas estruturas pastorais ou outras, das suas vigararias e arciprestados, das reuniões dos bispos e do Povo de Deus, só é católico, se for sinodal. A visão “clericocêntrica” nem é católica, nem é sinodal, por isso não assumida por todos e em todos os tempos, nem resulta da escuta do Povo de Deus. É neste Povo de Deus que reside o Espírito do Senhor, que fala e de onde irradia a Luz, não naquilo a que se chama visão “clericocêntrica”, que nunca existiu no Concilio de Jerusalém. O bispo de Roma, papa Francisco, não coloca no centro qualquer espécie de clero, nem de graus desse clero, coloca, isso sim, no centro Jesus de Nazaré, o seu Amor e Misericórdia, e pelas suas ações acredita que o caminho a seguir é o sinodal católico, não uma reunião, mas um caminho que se percorre e não embrutece.
Os diáconos fazem parte deste caminho sinodal, são sacerdotes no “sacerdócio comum dos fiéis”, de todos os batizados – há várias formas de ser batizado, como sabemos -, e nunca devem estar no centro do Povo de Deus, mas nas margens, assumindo assim total rutura com “o-clero-no-centro”, mas sendo o clero nas margens, servindo o Povo de Deus de que fazem parte. Nas “margens” mais traumatizadas, pelos poderes económicos, políticos, culturais, sociais ou religiosos. Se não o fizerem, não são diáconos, mas “servidores de deuses”, são não-católicos nem sinodais. Assim o entenderam os diáconos Estevão, Filipe ou Francisco de Assis.
Joaquim Armindo
Diácono – Portugal