COVID 19 – A IGREJA E A DESCOLINIZAÇÃO DAS MULHERES

A sempre interessante revista Concilium – Revista Internacional de Teología, no seu último número, reflete sobre a “Teología Decolonial: Violencias, Resistencias Y Espiritualidades”, uma questão de importância vital para o lançamento de uma Igreja não separada de minorias, e até de uma maioria: o sexo feminino. A citada revista apesenta todo um conjunto de articulação entre as violências, as resistências e a as espiritualidades, cruzando os movimentos sociais e as resistências aos poderes estabelecidos, sejam de cariz social ou religioso e aponta uma Teologia Decolonial, como resposta à hegemonia exercida por esses poderes. Nos documentos do Sínodo Amazónico isso é evidente, embora os resultados finais sejam tímidos por parte do bispo de Roma. Tais documentos vêm na sequência dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e da encíclica papal “Louvado Sejas”.

Convém, desde já, situarmo-nos nesta palavra “Decolonial” ou “Descolonialidade”, que não se refere a uma descolonização ou a uma pós-colonização, mas a um termo usado por movimentos latino-americanos, de forma a articular um pensamento libertador, nas circunstâncias concretas de cada povo e com um lugar teológico situado. Não sendo uma descolonização ou um após-colonização, como normalmente entendemos, mas o confronto com uma matriz colonial de poderes. As forças que o colonialismo gerou – é digno de leitura o que diz António Vieira ou Bartolomé de Las Casas -, tornaram-se fortes para a matriz de um novo colonialismo que gerou o imperialismo, o capitalismo, os nacionalismos, os populismos e a imposição no após-colonização da colonização dos poderes, amancebados pelas estruturas eclesiásticas. Embora a colonização tenha acabado os “novos poderes” formaram guetos, deixando um lastro de civilização ocidental que oprimem os mais desfavorecidos, entre as quais as mulheres. A “Descolonidade” será assim a libertação dos jugos poderosos, também nos âmbitos religiosos.

Segundo, Jardim, (2017), isso [a descolonidade] dá aos grupos sociais mais vulneráveis um conceito de atravessar fronteiras e contribuir para novas práticas e saberes. A cultura e a transculturalidade estabelecem uma reação às imposições hierárquicas, que tendem a forjar formas de dominação, as mesmas que os colonizadores do século XVI impuseram, utilizando os poderes militares e religiosos. A autora, do artigo referenciado, propõe a descolonidade das mulheres, que estão subjugadas a uma dupla opressão, de género e de raça, geradas pela Europa e existentes no âmbito das igrejas. E se algumas denominações religiosas estão a ultrapassar as questões de género, outras, mais numerosas, como a igreja romana, continuam a exercer um domínio social e material sobre as questões do género.

A descolonização das mulheres constitui, assim, uma necessidade tanto na américa-latina como em outros continentes, uma salutar ação objetiva e se quer, também, no âmbito da teologia – arma forte de domínio ou libertação -, e que consegue inculcar nas mentes ainda colonialistas – até nos seus próprios países -, uma lógica da cultura ontológica, capaz de vencer toda uma cultura enraizada, quer nos colonizadores, quer nos colonizados. Até porque a teologia formou uma latitude da sexualidade difícil de alterar, constituindo um verdadeiro problema, porque enraizada em costumes estereotipados que nada possuem da vida humana e que é castrador.

O COVID -19, agora aparecido, por causas não determinadas, e que talvez nunca se saibam, possui uma coloração nítida com este colonialismo. As economias baloiçam ao som de poderosos poderes económicos, prestes a agarrar a debilidade dos povos perante a doença, para confortavelmente inaugurarem um novo período de colonização tecnológica e cultural. Por isso esta conexão entre a descolonização das mulheres e o vírus. É possível vencer o vírus onde tantas mulheres dão os seus corpos pela defesa dos outros, mas onde a discriminação de género se faz sentir com mais acuidade, pressupõe, por exemplo, um confinamento religioso, talvez mais dramático do que aquele que a Amazónia padece1 . O COVID -19 será produto da imprudência humana em tratar a Terra Mãe, e os grupos mais desfavorecidos, como as mulheres. O COVID -19 vem demonstrar pelo menos às igrejas que subestimam as mulheres que ser homem é mais importante que a Eucaristia ou a absolvição.

O COVID -19 vem demonstrar que só onde um homem padre pode ter acesso ao ponto central da vida cristã: a Eucaristia, é uma aberração. A casa é uma igreja doméstica, mas o ato fundamental da vida cristã não pode ser celebrado, mesmo por mulheres que tudo dão a Jesus. Este Jesus não concordaria com tal.

Por tudo isto o COVID – 19 constitui um desafio aos homens dos poderes religiosos de Roma, para que reconheçam o sacerdócio comum dos fiéis, que eles mesmo proclamaram, mas não cumprem.

E aqui, também, os diáconos podem exercer um papel determinante.

Joaquim Armindo

Diácono – Porto – Portugal

Doutorado em Ecologia e Saúde Ambiental

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