Os diáconos e a Amazonía

Os diáconos estão ao serviço principalmente daqueles que nada possuem. Engana-se quem pensa que o diácono está ao serviço de uma liturgia desencarnada. Como se engana quem pensa que o diácono está ao serviço de uma Palavra, desinserida das lutas concretas dos povos. A Caridade, o Amor na sua plenitude, está ao serviço de Deus encarnado, na história de cada povo. Foi ou não foi assim que Deus se manifestou na sarça-ardente a Moisés? Numa sarça-ardente que arde continuamente no coração dos povos subjugados e maltratados para servirem “deuses estranhos”. Bezerros de ouro hoje pululam pelo nosso universo, a as Amazónias são constantes em cada rincão da Terra que Deus nos deu para nosso proveito, e para a amarmos. O diácono pertence a uma forma de organização da Igreja, para melhor servir as terras e os povos que as habitam. Cada povo tem a sua Liturgia, a sua forma de louvar o Senhor e bendizendo-o estar ao serviço de cada homem e cada mulher. A Liturgia que o diácono tem de observar é aquela que leva os povos ao enriquecimento do seu ser, no Ser. Não é uma amalgama mecanicista, desenraizada do povo, mas o brotar alegre de quem festeja o Senhor das suas vidas. O diácono encarna esta Liturgia porque surge do serviço, a ela serve e dela se serve para sair correndo a anunciar o Evangelho da Misericórdia de Jesus. As Liturgias importadas são a não-interculturalidade, a negação dos corações, a negação da vida de cada povo. As Liturgias impostas, tantos exemplos na história…, subjugam os povos e as pessoas sentem-se traídas, no seu ser, onde habita o Espírito do Senhor. Por isso o diácono ao percorrer o caminho Litúrgico segue no sentido da revelação das maravilhas do Senhor, manifestas já no seio dos povos.

Mas o diácono também proclama a Palavra, onde Deus fala ao seu povo. A Palavra não é uma simples leitura. Mas é no caminho para o Senhor que a podemos proclamar. Filipe, diácono, dá-nos o exemplo, proclama a Palavra no caminho, e assim verte nas dúvidas o diluvio da vivência cristã. O diácono vai…e vai ao encontro das incertezas – talvez, também nas suas incertezas -, e sacode o pó do caminho nas Novas do Evangelho. Sem caminho, sem caminhar, não há diácono, nem que este tenha a nomeação canónica. O caminho é feito do encontro da leitura do que se passa, na história concreta de cada povo. Por isso, esta proclamação é sentida na observância estreita do ser de cada um, onde o Espírito sopra, quando e onde quer e faz sentido. O diácono leva o Livro da Palavra bem alto, e as velas bem acesas. São as tábuas de Moisés e a sua sarça ardente. Proclamar é dar-se, não um ritual, mas um espevitar do Amor, dentro do aqui e do agora; não do ontem e do da altura, mas a encarnação perfeita do hoje, neste tempo, nesta terra, neste ardor.
Mas o diácono é acima de tudo um semeador da Caridade, enquanto Amor e Misericórdia de Deus. Esta caridade, este amor, de Jesus, é um pisar da Terra, e possui uma tripla reconciliação. De cada um consigo próprio, de cada um com o outro e de cada um com a Natureza. Qualquer sementeira que não seja reconciliadora, é uma intransigência própria de quem não possui a capacidade de perdoar como Santo Estevão. A tríplice reconciliação é que consegue a reconciliação com o Criador, com Deus. Se alguma parte for excluída não existe reconciliação com Deus, é uma abstração.

O Sínodo da Amazónia é esta tríplice reconciliação, não é uma guerra, mas um amor à Criação que Deus nos quis dar para cuidar. O diácono não pode passar à parte, como se isso fosse com os povos indígenas. Porque esta reconciliação é do mundo inteiro, das culpas e dos pecados nossos e dos nossos antepassados que delapidaram povos, conquistaram nações, com a espada num braço, e a cruz no outro.

O Sínodo da Amazónia é mais que reflexivo, é a oportunidade de uma visão que o Espírito nos dá gratuitamente, para entendermos o mal que fizemos. O diácono é chamado nestes tempos a ser sinal desta reconciliação, não como um serviço organizativo, mas como uma determinante para a compreensão do filho da Laudato Si`, que é o Sínodo.

Joaquim Armindo – Diácono da Diocese do Porto

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