O Diácono Permanente e a renovação das Paróquias Desafios e perspectivas ministeriais

Passados 50 anos da restauração do diaconado permanente, nesses tempos pós-modernos em que a existência de verdades absolutas e os fundamentos da sociedade cristã ocidental são francamente questionados, em que a fé é mediada pelo século e está cada vez mais subordinada ao dinheiro e ao poder, em que o próprio cristianismo se insere num processo de contínua secularização, o diálogo entre a Igreja e a(s) sociedade(s) nunca foi tão fundamental. Urge ao diácono permanente, ministro do diálogo (ponte) inserido no mundo, evangelizar apresentando de modo novo a mensagem eterna de Cristo, no perene desafio de tirar do baú coisas novas e velhas (Mt 13,52) a partir da dupla fidelidade tanto à Escritura e à Tradição, quanto aos desafios de cada época e lugar.

As Diretrizes para o Diaconato apontam para os diáconos o serviço da Palavra e da Caridade como as primeiras exigências da evangelização e asseguram que a missão evangelizadora do diácono não se restringe à homilia ou ao anúncio litúrgico da Palavra (DIRETRIZES, nn. 39 e 61). O Diretório descreve o diácono como promotor de uma nova evangelização. Diz que é mestre enquanto proclama e esclarece a Palavra de Deus, exatamente porque é próprio do diácono proclamar o Evangelho e pregar em toda parte. E como o diácono, atualmente, é um ministro prevalentemente da urbe, ele deve estar atento a algumas atitudes prioritárias inerentes à mentalidade que surge a partir das cidades para responder aos novos desafios da cultura urbana, entre as quais a necessidade de formação e diversificação de pequenas comunidades inseridas em um novo modelo paroquial entendido com rede de comunidades que permitam levar o evangelho a espaços específicos (escola, universidade, condomínios, diferentes etnias, ambientes especializados, etc.), bem como a criação e desenvolvimento de pólos de evangelização que atendam à típica mobilidade urbana, promovendo de forma efetiva, no que lhe couber, a passagem do modelo de paróquia que passe do territorial ao comunitário, ministerial e missionário. Nessas comunidades setoriais e nas diversas “tribos” urbanas, nas periferias, inclusive existenciais do ser humano, o diácono é chamado a ser artífice de relações onde todos e cada um se sintam incluídos, valorizados e membros uns dos outros, favorecendo a cultura do encontro e da misericórdia, sobretudo entre os jovens e os idosos.

Nesta rede, cada comunidade se torna disponível ao serviço da diaconia em favor da unidade/comunhão vivenciando os três ministérios essenciais da Igreja: o serviço da Palavra, o serviço litúrgico da oração e o serviço da assistência aos pobres. O diácono, sinal do próprio Cristo Senhor servo, é animador do serviço da Igreja junto às comunidades cristãs e intérprete das suas necessidades e aspirações -Comissão Episcopal para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (17.07.2012).-. O documento de estudos 104 da CNBB recorda aos diáconos a necessidade de fortalecimento de seu ministério na renovação paroquial. Também do diácono os novos tempos exigem uma “conversão pessoal e pastoral” que se traduzem “nas muitas frentes onde deve atuar como servidor da comunidade. [O diácono] deve se ocupar com a evangelização, a formação dos discípulos missionários, a celebração dos sacramentos que lhe competem e especialmente as obras de caridade da paróquia” (n. 182).

No novo planejamento da paróquia como rede, não cabe uma concentração de atividades na ‘matriz’. É preciso descentralizar, investir em pequenos grupos, animados e coordenados por diáconos e/ou cristãos leigos, onde o sentimento e o vínculo de pertença seja vivenciado e fortalecido. Nesses grupos ou comunidades podem ser desenvolvidos pelo diácono muitos serviços e ministérios, entre os quais a presidência da celebração da Palavra, a pastoral da esperança para acompanhamento aos enlutados, a devoção mariana e a piedade popular, a preocupação com os pobres e necessitados.

Fica cada vez mais claro o entendimento de que a criação, a animação e a coordenação das comunidades é área privilegiada de atuação do diácono. Dentre as muitas experiências, há também realidades onde a administração de uma paróquia é confiada a um ou mais diáconos permanentes. É sempre uma possibilidade ligada ao ministério da caridade do diácono, que é desafiado, neste caso, a pensar e organizar a paróquia como espaço privilegiado para o exercício de um modelo de Igreja toda ministerial, servidora, acolhedora e pobre. Paróquias ‘samaritanas’, com espírito de diaconias…

“Evangelizar é tornar o reino de Deus presente no mundo” (Evangelii gaudium 176). Uma igreja pobre para os pobres exige que os primeiros destinatários da nova evangelização sejam exatamente os empobrecidos. A Igreja existe para evangelizar, por isso esta tarefa está bem no centro da missão do diácono desde sua ordenação: recebe o evangelho de Cristo do qual te tornaste mensageiro. O objetivo da diaconia do Evangelho é, portanto, criar solidariedade comunitária, edificando a Igreja como corpo de Cristo no mundo. Mais do que falar a respeito do Evangelho, evangelizar é ser sinal vivo da própria Boa Nova, como reza a célebre frase atribuída ao diácono São Francisco de Assis: predicate il Vangelo e, se è proprio necessario, usate anche le parole. Ou em bom português, preguem o Evangelho, e se for realmente necessário, usem também as palavras.

Por outro lado, é preciso que os diáconos estejam atentos para não sucumbir aos riscos do pragmatismo e do ativismo. O compromisso da igreja não consiste exclusivamente em ações ou programas de promoção e assistência, e o que o Espírito propõe não é um excesso de ativismo, mas antes de tudo uma atenção prestada ao outro, uma preocupação com a pessoa e o desejo de procurar o seu bem (EG 199). Ensina o Papa Francisco que ‘a pior discriminação que sofrem os pobres é a falta de cuidado espiritual” (EG 200). O desejo de vida em comunidade e do compromisso amoroso e fraterno com o outro só nasce a partir do querigma. Em sendo assim, a primeira e maior caridade que podemos fazer é levar a Palavra de Deus aos corações e plantar neles sementes do reino!

Neste contexto, cinco áreas despontam como sendo de destacada importância para a realidade da Igreja hoje, nas quais o diácono pode exercer seu ministério, servindo, exatamente, de modo novo e entusiasmado à evangelização: (1) catequese renovada, (2) acompanhamento das famílias (3) acompanhamento de pequenas comunidades inseridas numa rede de comunidades (4) ecumenismo e (5) Teologia Pública ou Teologia da Cidadania. Ao assumir essas tarefas numa “Igreja que existe para evangelizar’”, o diácono estará se alinhando às chamadas ‘cinco urgências’ das práticas pastorais apontadas pela Igreja no Brasil, ou seja, iniciação da vida cristã, animação bíblica na vida e na pastoral, comunidade de comunidades, serviço da vida plena para todos e permanente estado de missão.

Diác. Julio C. Bendinelli. Equipe Nacional de Assessoria Pedagógica da CND. Mestre doutorando em Teologia Sistemática (PUCRio), professor de teologia e Sagrada Escritura, escritor, articulista e conferencista. Atualmente é o administrador da Capelania da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo.

 

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