Diaconado Permanente na hora actual da Igreja em Portugal

 

D. António Baltasar Marcelino

Bispo Emérito do Aveiro

Jornada Pastoral dos diáconos permanentes – Fátima, Portugal, 1º de dezembro de 2009

 

Introdução ao tema

 

 

Por esses dias, como o número dos discípulos ia aumentando, houve queixas dos gregos contra os hebreus, porque as suas viúvas eram esquecidas no serviço diário. Os doze convocaram, então, a assembleia dos discípulos e disseram: “ Não convém deixarmos a Palavra de Deus para servirmos à mesa. É melhor procurardes entre vós, irmãos, sete homens de boa reputação, cheiros do Espírito Santo e de sabedoria, e confiar-lhes-emos esta tarefa. Quanto a nós, entregar-nos-emos assiduamente à oração e ao serviço da Palavra”. A proposta agradou a toda a assembleia e escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, Filipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Permenas e Nicolau, prosélito de Antioquia. Foram apresentados aos Apóstolos que, depois de rezarem, lhes impuseram as mãos.” (Ac 6, 1-6)

 

Quero começar por estas palavras dos Actos dos Apóstolos, que designam a matriz bíblica e eclesial do diaconado permanente, criado na Igreja para o serviço dos pobres. Palavras cheias de ensinamentos da Igreja nascente, para a Igreja de ontem e de hoje, que não se podem esquecer, dado que, se elas foram iluminação para a iniciativa apostólica da instituição, também o podem ser para o melhor discernimento na escolha a fazer e no serviço a realizar.

 

Sublinho a responsabilidade dos Apóstolos, desejosos de ser fiéis ao essencial da missão recebida, perante o aumento dos crentes e as queixas ouvidas; o cuidado devido à comunidade dos irmãos em necessidade; a intervenção indispensável da assembleia dos discípulos, depois de consciencializada, em ordem à solução do problema sentido; a seriedade como ela assumiu a participação que lhe foi pedida; a obediência aos critérios estabelecidos; a abertura da missão aos prosélitos; a confirmação, por parte dos doze Apóstolos, depois da oração e pelo gesto da imposição das mãos, que, também, Cristo tivera com eles…

 

Como é importante para a Igreja, bem como para todos os seus membros, prestar atenção às exigências da Comunhão. São elas que ajudam a vencer a tentação de uma Igreja dominada pelos critérios administrativa. Seria pobre a solução apostólica se tudo terminasse no êxito final de 7 diáconos para se resolver um problema. Não menos importante, é a sábia e prática pedagogia dos Apóstolos na condução de todo o processo, que sendo em favor de todos, tinha a ver com todos.

 

Princípios gerais a ter em conta

 

1. Quem recebe um dom, sem que tenha sido por mérito próprio, mas sim em favor de outros, não pode deixar de aprofundar, cada dia, o valor, a razão e o sentido desse dom, ser-lhe fiel, não deixar desvirtuar, nem cair na rotina, e estar atento ao seu melhor investimento, ou seja, que ele seja, verdadeiramente, e como entendido e acolhido, um dom para todos, a quem é devido.

 

O diaconado permanente é um dom desta natureza, feito à Igreja, frente a uma necessidade concreta e, através dela, às pessoas que reclamavam a sua atenção e cuidado…

 

A realidade que nos cerca, com seus problemas e desafios, tanto na comunidade eclesial de que somos membros, como na sociedade em que vivemos como cidadãos, ajuda-nos hoje a penetrar na natureza do dom e no seu melhor aproveitamento pastoral.

 

2. A Igreja é, por sua natureza, serva, ou seja, exerce, em permanência, a “diaconia” de Jesus Cristo, o Servo, que veio ao mundo, como Ele próprio disse “não para ser servido, mas para servir e dar a vida, a fim de que todos se salvem”. A lição do lava-pés (Jo 13, 3-15) é bem elucidativa para que nenhum servidor se esqueça que o é, e esteja atento à tentação de mais desejar ser mestre. A parábola do bom samaritano (Lc 10, 25-37) marca o sentido desta diaconia e molda o coração para melhor a exercer.

 

3. Deus não escolhe ninguém para o privilegiar ou honrar ou para o distinguir à maneira profana, nem para compensar os serviços a Ele prestados ou os talentos, que d´Ele também foram gratuitamente recebidos. Escolhe por amor ao seu Povo e para que não falte a este Povo e a cada um dos seus membros, quem os ajude a ser de Deus, a andar pelos Seus caminhos e a realizar o Seu plano de salvação universal, a sentir-se amado.

 

A escolha envolve separação, mas separado não quer dizer distinguido por honras ou favores pessoais, mas post
o em condição de não esquecer nunca a razão de ser do seu chamamento. “Não fostes vós que Me escolhestes. Fui Eu que vos escolhi para que vades, deis fruto e fruto que permaneça.” Assim gravou no coração dos escolhidos a razão de ser da sua escolha.

 

A escolha de Deus não se faz para determinar classes sociais, porque a Igreja não é uma sociedade de classes. Ele é uma comunhão de dons, ministérios e serviços, ordenados todos e sempre, para a edificação harmónica do Povo de Deus.

 

Este serviço essencial da comunhão exerce-o a Igreja, como Serva de Jesus Cristo, através da profecia, da liturgia, da caridade, tornando-se koinonia, martirya, diaconia e liturgia, em ordem à edificação da comunidade cristã, lugar de vivência da Comunhão, da visibilidade do Reino, e da sua concretização como Povo de Deus peregrino, em marcha para a sua plenitude. Exerce-o, ainda, como serviço humanizador e solidário para com a sociedade em geral.

 

4. O bispo, como sucessor dos Apóstolos, é, por razão do seu ministério, o primeiro responsável das acções eclesiais essenciais, o garante da unidade, o promotor da comunhão e o modelo de servidor. Tem como colaboradores necessários para todas estas acções, os presbíteros, e, também, os diáconos, na parte que lhes diz respeito.

 

Enquanto os presbíteros são chamados a exercer e a animar a comunidade com todas as acções eclesiais, os diáconos são ordenados para o exercício de todas elas, dando prioridade à diaconia, sempre entendida, segundo a sua origem bíblica, como serviço e cuidado dos mais pobres e menos atendidos, e atentos, em cada tempo, às diversas formas de pobreza. Diaconia que exercida no seio da comunidade cristã é chamada a partilhar, promover e praticar a comunicação cristã de bens. No seio da comunidade cristã e da comunidade humana a diaconia expressa-se, de modo especial, servindo os excluídos sociais e os marginalizados, lutando pela sua dignificação humana e integração social

 

5. Todos os baptizados são fieis que, “incorporados em Cristo pelo Baptismo e integrados no Povo de Deus, se tornam participantes, a seu modo, da função sacerdotal, profética e real de Cristo, exercendo na Igreja e no mundo a missão de todo o povo cristão, na parte que lhes corresponde.” (LG 31)

 

É entre estes, como já o dissemos, porque todos eles têm uma igual dignidade, que Deus escolhe e chama alguns, entre os seus filhos, por mediação da Igreja, ao ministério ordenado, a fim de que exerçam, como filhos e Deus e membros da Igreja, o mesmo ministério de Cristo, na parte que, a partir da sua ordenação, lhes é própria.

 

O seu serviço, a sua diaconia, não se exerce por conta própria, nem os pode separar da missão da Igreja e do dever de ajudar todos os baptizados, a que tomem consciência da sua dignidade, e a viverem e agirem, de harmonia com a missão que lhes compete, na Igreja e no mundo.

 

Assim a Igreja vai realizando a sua diaconia através de uma maior participação no serviço aos outros de todos os seus membros.

 

A entrega aos outros dá aos que a praticam na verdade, uma alegria inesperada e o rosto da Igreja aparecen assim, através da sua missão de serva, cada vez mais um rosto de misericórdia, de alegria e de paz. Não é esse o verdadeiro rosto de Deus Pai, revelado em Jesus Cristo?

 

Olhar a realidade actual da Igreja e da sociedade

 

6. O mundo vai mudando e como a Igreja está implantada na seio da comunidade humana, também ela vai mudando, sendo chamada a viver, diariamente, novas situações, novos apelos, novos desafios, novas formas de proposta e resposta aos problemas que emergem e põem em causa tradições e fórmulas que perderam o sentido. Os seus membros são, também, membros dessa comunidade humana e civil, que sofre mudanças profundas e rápidas, enriquecidos por uma dupla cidadania que os responsabiliza numa e noutra comunidade.

 

O diácono permanente tem um campo próprio de acção diaconal no seio da sua Diocese. O seu bispo lho determina, de harmonia com o ministério recebido e a sua condição própria, distinta da dos presbíteros A sua presença activa na sociedade permite-lhe, em razão da vida familiar e profissional e dos desafios que tem ele próprio de enfrentar cada dia, experiências multiformes e renovadas, que melhor o levam a conhecer a realidade, e a levar para o seio da Igreja, um contributo existencial válido, que outros membros ordenados para o serviço
da comunidade cristã, não têm, pelo menos na mesma tónica, pessoal e existencial.

 

Se quiser dar exemplos comezinhos e práticos, aí vão alguns. Como esposo pode ver o desamparo de muitos casais; como pai poderá sentir a pobreza pastoral das paróquias em ordem ao acompanhamento adequado aos mais jovens. Como profissional poderá sentir ao vivo, os efeitos da crise das empresas, do desemprego, próprio ou de colegas…

 

7. Olhamos a Igreja, que amamos, e que vemos nela de mais saliente e interpelante?

 

É crescente o número de diáconos permanentes nas dioceses; há um despertar consciente de muitos cristãos para a vivência da sua fé e para o compromisso apostólico, assim como, há uma vontade mais alargada, por parte de leigos adultos, de formação cristã; a adesão a movimentos familiares e de casais; crescem as iniciativas de grupos de jovens, programadas segundo a sua mentalidade, expressões e interesses; o voluntariado missionário de muitos jovens e mesmo de adultos já em serviço profissional; as vocações de adultos com cursos superiores; a presença efectiva da Igreja no campo sócio-caritativo com inumeráveis instituições e serviços; o manifesto alargamento da rede de comunicações, segundo as novas tecnologias, ao serviço da evangelização; a generosidade extraordinária de muitos agentes pastorais (clérigos, consagrados e leigos) …

 

Porém, a Igreja em Portugal, como no comum dos países da Europa, passa, ao mesmo tempo, por momentos difíceis e complexos, tais como, sem pretensão de esgotar a sua enumeração:

 

–         Menos padres e mais idosos e doentes.

–         Sobrecarga dos mesmos que, em algumas dioceses, têm a seu cargo várias paróquias ou são sozinhos em paróquias grandes, que antes tinham pelo menos dois padres.

–         Padres demasiadamente ocupados com obras sociais e preocupados com os problemas que as mesmas enfrentam hoje.

–         Padres mais novos a abandonar o exercício do ministério.

–         Diminuição manifesta do número de cristãos a procurar o sacramento da

–         Reconciliação

–         Tendência de diminuição de vocações para o presbiterado

–         Frequentemente os padres novos apresentam-se frágeis e, quando sós, à frente de paróquias, manifestam, frequentemente, um certo individualismo e prepotência.

–         Em muitos casos maior cuidado com o esplendor litúrgico. Que com a educação da fé e as exigências da caridade efectiva para com os mais pobres;

–         Crise de vocações de consagração, mormente em institutos femininos de vida activa

–         Famílias a desagregarem-se, mesmo após muitos anos de casamento e de prática religiosa regular, situação periclitante das gerações mais idosas;

–         Aumento dos divórcios e das uniões de facto e diminuição dos casamentos na Igreja.

–         Menosprezo pela cultura da vida, com inúmero de abortos e tentativas de novas formas de falta de apreço pela mesma vida.

–         Muitos jovens a afastarem-se da Igreja, mesmo quando tiveram 10 anos de catequese e receberam a Confirmação.

–         Agentes pastorais com pouca preparação para dar razão da sua fé e realizarem o apostolado que lhes é pedido.

–         Inúmeros campos de acção pastoral e apostólica a descoberto na sociedade, mesmo quando há aí cristãos, que, por vezes e de modo fácil, se omitem e retraem.

–         Crescimento de movimentos apostólicos com pouca dimensão missionária  

–      &n
bsp;  Menosprezo pelas normas morais que a Igreja propõe e defende como evangélicas.

–         O desafio dos novos imigrantes, com expressões religiosas e culturais próprias…

 

8. Ao mesmo tempo, e com repercussão clara na comunidade eclesial e na vida dos seus membros mais dependentes das tradições, verificamos:

–         a crescente secularização, que não sendo, em si mesma, um mal ou um dado negativo, provoca inúmeras mudanças sociais e culturais que apanharam a Igreja, em muitos campos, verdadeiramente desprevenida. São expressões da modernidade:

–         a legítima personalização e consequente afirmação de liberdade pessoal que não admite peias;

–         o individualismo e egoísmo frutos de uma mal entendida liberdade;

–         o desprezo pelas leis, normas e todas as formas de autoridade;

–         a participação, a todos os níveis, como um direito e um dever;

–         o confronto com novas expressões religiosas, das confissões mais  consistentes às seitas mais facilitadoras;

–         a frequente proclamação pessoal de ateísmo e agnosticismo e a militância operada, a partir de grupos organizados que os professam;

–         as muitas leis necessárias, cada vez mais influenciadas pelo laicismo reinante, e menos pela tradição cristã, cultura e história do país que somos; o número crescente de cidadãos com cursos superiores, cada vez mais exigentes por via da sua cultura e estatuto social;

–         as crises sociais que afectam o mundo empresarial e económico e levam ao crescente desemprego portador de situações gravosas para a vida das pessoas e das famílias;

–         a publicidade que arrasta ao consumismo e à permissividade moral;

–         a política cada vez mais vazia de ideologia e transformada em prática de imediatismo tapa-buracos e favorecedora de interesses de grupos;

–         o pessimismo ante a situação do país;

–         o clima alargado de insegurança, intolerância e corrupção;

–         a criminalidade que atinge familiares e relações afectivas, em meios  antes moldados pelo agir cristão das comunidades…

 

Certamente que todos poderíamos ainda acrescentar outras expressões desta realidade, que não nos passa ao lado, mas nos cerca e nos influencia.

 

O diaconado permanente neste contexto eclesial e social

 

9. É tempo de os mais responsáveis se porem em causa e de se interrogarem, em assembleia, mas, também, em cada diocese com os seus diáconos e os presbíteros e os leigos com que eles trabalham regularmente, sobre o lugar do diaconado permanente, neste contexto eclesial e social, como serviço da Igreja aos outros, mormente aos mais pobres, atingidos pela pobreza de sempre a agora pelas novas formas de pobreza.

 

O tempo é de reflexão, para que se evitem várias tentações, próprias dos tempos de crise, como aqueles que vivemos e cuja tendência é para perdurar e se agravar.

 

Tentação de desanimar ante a grandeza e a urgência dos problemas e dos poucos meios de que dispomos? Tentação de uma generosidade atabalhoada que quer responder a tudo ao mesmo tempo? Tentação de pensar que as coisas vão mudar e nada de dramatismo? Tentação de investir os recursos existentes, para apenas considerar a situação da Igreja e das suas comunidades, privadas ou agora com menos de apoios religiosos que sempre tiveram?…

 

Tudo isto pode levar a descentrar do essencial da missão ou a pensar que, quando nada se pode, a nada se é obrigado e, então, salve-se quem puder.

 

10. Na sua história sempre a Igreja passou por situações de crise e desafios difíceis. E, por fidelidade à missão, com a luz e a força do Espírito, não se negou nunca à resposta possível. Assim foi superando os problemas em campo. Quando outros surgiam, foram encarados com iguais sentimentos e propósitos.

 

Deus a ninguém exige tudo, mas não dispensa o que cada um pode dar.

 

Os tempos, portanto, são de responsabilidade, mas sempre de esperança. Se a Igreja souber ler e discernir os “sinais dos tempos, ela terá luz para lhes responder, com a luz e a força do Espírito que a anima.

 

11. É verdade que o diácono, em comunhão com o seu bispo, a este deve estar unido para responder ao que lhe é pedido. Porém, salvos casos especiais e, mesmo assim, considerados e atendidos na fidelidade ao que no ministério diaconal é prioritário, o serviço dos mais pobres, outros serviços pedidos, mesmo realizando-os generosamente, não devem descentrar o diácono do fundamental.

 

A tendência mais generalizada dos diáconos permanentes vem se afirmando, na maior parte dos acasos, ocuparem, preferentemente, do serviço do altar, dos sacramentos e dos sacramentais, ou seja no campo litúrgico.  

 

É um serviço para eles mais fácil, menos criativo e exigente, e que melhor os coloca em realce na comunidade.

 

Importante, não se duvida e cabendo, como acção importante, no âmbito do ministério. Zonas da Igreja, tanto o realçam, que os diáconos mais vão aparecendo a realizar, por sistema, os papeis do presbítero que lhe são possíveis, que outros que o ministério comporta e ficam a descoberto.

 

Não esqueço que o Vaticano II no Dec Ad Gentes (16) diz que podem ser confiadas ao diácono permanente paróquias e comunidades cristãs e que o CDC dá normas quando tal terá de acontecer. Mas o regime de “missão ad gentes” ou a situações mais graves que tal justificam não devem ser, a meu ver, a regra normal.

 

Esta insistência, por vezes pouco crítica e alheia aos critérios das origens, tem feito crescer a esperança nostálgica de muitos diáconos, poderem um dia ser ordenados presbíteros, o que aliás já vai acontecendo. Não é verdade que muitos criticam o facto de se chamarem “permanentes”?

 

A falta de padres, a sua idade avançada e a sobrecarga de trabalhos pastorais diversificados, convidam os bispos a colmatar estas deficiências com a nomeação de diáconos para apoio litúrgico nas paróquias.

 

Nada impede que, ao ser assim, os trabalhos litúrgicos sejam considerados um complemento, mas que a primeira ocupação seja na linha da catequese familiar e juvenil, hoje um largo campo de pobreza, e da acção sócio-caritativa, onde não faltam situações apelativas novas, o cuidado dos doentes e dos mais pobres de pão e de amor, das vitimas da solidão por abandono ou desatenção dos familiares ou porque os não têm, dos imigrantes desatendidos das minorais sociais e étnicas…

 

O trabalho nas instituições de solidariedade social da paróquia, bem como a o lançamento ou a ordenação, a animação e o acompanhamento dos serviços da caridade do arciprestado ou vigararia e da unidade pastoral, pode e deve ser um campo prioritário de empenhamento pastoral dos diáconos, não como técnicos sociais, mas como animadores pastorais.

 

De igual modo a pastoral familiar e juvenil, a pastoral das comunicações sociais, do turismo, das migrações, das novas realidades sociais, de grupos de voluntariado, com os Bombeiros, da cultura, nas suas diversas expressões, da promoção da Doutrina Social da Igreja nos grupos e nas comunidades, da defesa e a valorização do património histórico e religioso, e ainda os serviços da Cúria Diocesana e o acolhimento paroquial, são campo aberto para os diáconos permanentes.

 

Uma exigência de formação cada vez mais premente

 

12. Certamente que temos consciência de que ser diácono neste tempo e para os serviços que traduzam o exercício da diaconia, mormente no campo da formação cristã, catequese ou outra forma, e no campo da caridade, exige muito mais do que saber manusear, correctamente, o ritual do Baptismo, do Matrimónio ou o livro das exéquias, ou ser expedito no serviço do altar, mesmo que acompanha o bispo, ou mesmo da formação inicial e em um ou outro encontro de formação organizado pela Diocese.

 

A fé tradicional, de recepção acrítica por p
arte de muita gente e que, habitualmente, não foi além de uma catequese infantil exige agora, quando se trata de encontros de formação de adultos ou de formação por motivo da recepção do Baptismo dos filhos, exige agora maiores conhecimentos e mais actualizadas vivências pessoais.

 

Os problemas sociais têm hoje muitas causas e, por isso mesmo, muitas leituras. Muitas vezes exigem uma resposta em colaboração ou rede. Daí uma abertura a outros intervenientes, na fidelidade às pessoas e à verdade evangélica. Problemas novos, da mais diversa ordem, saem-nos ao caminho, e é preciso saber interpretá-los, escutar os seus intervenientes, para se possam inovar respostas válidas…

 

O conhecimento da DSI da Igreja é uma urgência. Às tentativas legais em ordem à família e sua consistência, em ordem à vida e seu menosprezo, não se responde com simples gestos de boa vontade, nem com palavras de condenação ou comiseração. Responde-se com o testemunho de vida, as razões da fé, as orientações do magistério…

 

A formação contínua é, portanto, para os agentes da pastoral, um dever de consciência que afecta quem a deve propor de modo acessível, como os serviços diocesanos, e de quem a deve acolher, com assiduidade e interesse.

 

Diácono permanente, fermento e semente activos de diaconia na Igreja e na sociedade

 

13. A tendência para o individualismo, para pensar nos outros só em momentos de calamidade ou em campanhas de apoio, para se fechar no seu mundo, sem abertura solidária permanente ao mundo dos outros, ganhou raízes profundas em algumas comunidades cristãs: tensões que vêm de longe nas estruturas territoriais, dioceses e paróquias, nos diversos movimentos laicais, antigos e modernos, nos agentes dos serviços pastorais clérigos e leigos… Coisas do passado, hoje muito mais atenuadas, mas que perduram enquanto a realidade eclesial da “ Comunhão” não for assimilada e façam da Igreja uma escola de comunhão, como pediu João Paulo II, como projecto do III Milénio.

 

No conjunto da vida social o individualismo cresce e as diversas estruturas sociais favorecem esta tendência empobrecedora.

 

Vive-se cada vez mais em prédios onde ninguém se conhece nem se quer conhecer, ou em urbanizações fechadas e guardadas por seguranças; o estilo de vida é cada vez mais urbano e influenciado pela mentalidade urbana; as grandes superfícies comerciais são espaços de massificação, de trocas e de escolhas apressadas, ou de simples procura de lazer sem criar laços pessoais; os transportes pessoais multiplicam-se e os públicos são, frequentemente, colmeias de incomunicação que despejam gente sempre apressada e com ares de preocupada; a televisão e as novas técnicas de comunicação geram isolamento no seio da própria família, e cada um mais comunica com o seu aparelho pessoal, do que com quem vive ao seu lado; telefona-se, andando apressadamente na rua, sem se reparar por quem se passa ou pelo que quer que seja que chame a atenção…

 

Um mundo que se torna frio, em que não há tempo para os outros, nem para os gestos gratuitos que lhes alimentem a vida…

 

Mundo insolidário, onde aumenta a solidão, escasseia a relação, mesmo que se viva em multidão… Mundo, como nos recorda Bento XVI, na sua última encíclica “Caridade na Verdade” onde a globalização, mesmo quando nos aproxima e nos diz o que se passa no mundo, não nos faz irmãos, nem nos molda o coração ao outro.

 

14. A diaconia, vivida a sério, torna-se fermento e semente activos, no seio desta massa humana, cada vez mais amorfa e humanamente pouco eficaz.

 

É preciso que os diáconos permanentes, cujo número cresce entre nós, sintam o dever de fermentar a comunidade cristã e a sociedade onde vivem e onde tocam, com espírito de serviço gratuito e fraterno, atenção aos outros, acolhimento respeitoso e atento, partilha de bens, mormente para com os mais pobres e desprotegidos.

 

O diácono é sempre diácono, esteja em serviço pastoral, esteja em tempo de trabalho ou em lazer. Sempre alguém que incarna livremente a condição de ser um para os outros

 

Fazem-no, na comunidade cristã e nos espaços religiosos, no seio da família, nos grupos com que trabalham, por todos os modos possíveis. Aí devem ter o propósito de desencadear o aparecimento de novos agentes apostólicos e não quererem fazer tudo ou estarem em tudo. Mas, também, na pregação e catequeses que tenham de fazer, nas quais nunca devem esquecer que são diáconos e têm o dever de meter em tudo, de modo normal, o apelo à diaconia, dado que numa Igreja que se proclamou serva, todos se devem considerar servos e actuar como tal.

 

Mas, sentem-se, igualmente, fermento e semente de diaconia na sociedade, nas ocupações profissionais, nas relações pessoais, nos compromissos socialmente assumidos, nas intervenções privadas e públicas, onde não têm que publicitar o seu diaconado, mas fazer que o mesmo transpareça no que se diz e se faz, e no modo de fazer uma e outra coisa.

 

Conclusão

 

15. Vêm-se aconselhando as Dioceses a repensar o ministério diaconal, passados que são mais de quarenta anos da sua restauração na Igreja, depois de séculos longos de suspensão.

 

Num mundo que muda e obriga a Igreja a mudanças na sua acção pastoral, esta reflexão tem sentido e interesse. A mudança, quando se trata de serviço aos outros é mais urgente, porque a rotina atinge a todos e a inovação impõe-se mais.

 

O ministério diaconal, como tal, não está em discussão. Está, sim, o seu exercício e o seu melhor investimento pastoral, a clarificação da sua relação com os outros graus do ministério ordenado, a sua integração nas comunidades cristãs, e, também, na sociedade, dada as características de se ordenarem homens casados e profissionalizados, a expressão da sua originalidade como ministério ordenado, a sua melhor interpretação à luz da sua origem bíblica.

 

Também já existem diáconos permanentes em muitas dioceses em número suficiente para que a reflexão se faça a partir da sua experiência pastoral e da evolução social e eclesial operada.

 

Desta tarefa se ocupa a Comissão Episcopal das Vocações e Ministérios, mas pouco resultará deste esforço, se em cada diocese não se fizer, de modo empenhado, a mesma reflexão a diversos níveis.

Deja una respuesta

Tu dirección de correo electrónico no será publicada. Los campos obligatorios están marcados con *