Diácono José Antonio Jorge (Arquidiocese de Campinas, Brasil): 2017 E A VIOLÊNCIA

* Diácono José Antonio Jorge

Todos os dias, ao abrir os jornais, ficamos chocados com a crescente violência que nos rodeia. A própria Sagrada Escritura em seu primeiro livro – Gênesis – relata a violência causada por ciúmes com Caim matando seu irmão Abel. Há poucos dias, em plena festa do Natal – quando celebramos o Senhor da Paz! – deparamos com o assassinato do ambulante Luiz Carlos Ruas de 54 anos covardemente agredido por dois homens na estação Dom Pedro II do metrô, região central de São Paulo. Cena horrível e brutal transmitida pela televisão mostrando a impassibilidade de muitas pessoas ao redor dos agressores sem que alguém tomasse qualquer atitude de defesa do ambulante. Assistiram ao assassinato sem a menor indignação! Se os expectadores se unissem, gritassem e se aproximassem do massacre poderiam ter salvo um cidadão trabalhador e pai de família. Logo em seguida, os jornais noticiaram a morte de um diplomata grego cuja suspeita recai sobre sua esposa e seu amante um policial militar. Depois de assassinado, o diplomata foi colocado em seu carro onde foi localizado carbonizado. Depois o ataque à discoteca em Istambul, o massacre em presídio do complexo penitenciário Anísio Jobim e por fim o homem que metralhou a esposa, o filho e doze familiares num surto diabólico ou psicótico! Os casos de violência são incontáveis. A vida está banalizada. Mata-se por alguns centavos ou, às vezes, sem qualquer motivo. Muitas vítimas são roubadas e assassinadas em seguida, à sangue frio. Puro exercício do ódio. Perdemos um jovem seminarista que passando por um local onde se perpetrava um roubo, foi atingido por um tiro. Um dado alarmante: em 2016 o latrocínio – roubo seguido de morte – cresceu 57% em Campinas.

Como consertar esta situação? Tudo começa no lar que hoje é desestruturado, materialista, consumista, com pais ausentes. É lá que se forja o caráter, incutindo ética e moral pelo exemplo e não apenas por palavras.  Em termos de segurança, sentimos um esvaziamento do Estado – hoje quase falido – com funções terceirizadas que não nos protegem… temos de nos defender. Na consulta popular, 67% foram a favor de manter o armamento. A desconfiança é o primeiro degrau de violência: com o sentimento de perigo – devemos nos defender independentemente? Presenciamos grandes massas humanas não cidadãs que geram um caldeirão de violência. Mais 1 ingrediente: como viver com três ou mais filhos em 55 m2? Há uma concentração espacial com crescente densidade da população e serviços. Nos centros urbanos ocorre grande heterogeneidade no qual o diferente tem direito a existir. Além do espaço físico, a cidade é construída pelas relações sociais. Na origem “cidade” (em grego “polis”) significava “muro, separação” e hoje sentimos a recuperação deste sentido.

A mídia exerce um papel fundamental administrando o real e a interpretação. Em que medida a mídia garante a imparcialidade para que a justiça seja feita?   Tudo isto sem  exacerbar o medo: sensação/ sentimento/ configuração de um imaginário? Há um imaginário de segurança que pode nos levar, por exemplo, a nos trancar dentro de casa.

A indignação das vítimas é fundamental. Quando for cobrar na justiça, embora lenta, precária, corrupta, mas melhor que os juízos sumários (justiça com a própria mão) é preciso que a mídia de informante não passe a julgadora. Vamos fugir do fundamentalismo religioso: “o mundo é assim, porque Deus o fez assim”. Voltando ao livro do Gênesis, tudo o que foi criado foi visto por Deus como bom. O ser humano é que não compreendeu o plano do Criador e estragou tudo! Na vida cotidiana ocorreu uma perda de espaço da religião.   O espaço é maior, por exemplo, no esporte. Nas Olimpíadas há mais gente do que nos cultos religiosos. Hoje é mais fácil mudar de religião do que de time de futebol! As pessoas dedicam mais tempo às academias de ginástica do que à oração diária. A religião não ocupa mais o primeiro lugar na vida das famílias. A religião é uma prática facultativa, não obrigatória.

Quando Koff Anan, deixou a Secretaria da ONU, após uma gestão de 10 anos declarou: com frustração, deixo o mundo mais inseguro, mais faminto, valorizando menos os direitos humanos! E Ovídio, o poeta latino e especialista em política nos idos do ano 43 a.C., chorou ao deixar Roma declarando “ Tudo o que é violento deve ser banido”!

José Antonio Jorge é Diácono da Arquidiocese de Campinas, Mestre em Teologia e bacharel em Direito, autor do Dicionário Informativo Bíblico, Teológico e Litúrgico e do livro “Escuta Cristã” da Ed. Vozes.

Joseajorge@hotmail.com

Tomado de: cnd.org

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