Diácono José Durán: O DIÁCONO NA SOCIEDADE E NA IGREJA À LUZ DE APARECIDA" (II Assembleia Geral Não eletiva da CND. 20/05/2017)

 

Palestra do Diácono José Durán y Durán na II Assembleia Geral Não Eletiva da CND – 18 a 21 de maio de 2017, em Aparecida, SP

 

O DIÁCONO NA SOCIEDADE E NA IGREJA À LUZ DE APARECIDA

II Assembleia Geral Não Eletiva da CND – maio de 2017

 Diác. José Durán y Durán

Introdução

Iniciamos o nosso tema recordando o contexto em que temos de viver e agir. “É habitual hoje falar-se de um “excesso de diagnóstico”, que nem sempre é acompanhado por propostas resolutivas e realmente aplicáveis”. (EG 50).

Mas temos que partir da realidade, mesmo se a nossa visão é incompleta, e as vezes, parcial. É nesta realidade que podemos detectar os sinais dos tempos. Temos como missão escutar e dar respostas às angústias e esperanças do homem de hoje.

As angustias e esperanças do homem de hoje são a angustias e esperanças da Igreja (Vat. II, G S n. 1). A Igreja faz parte da sociedade. Ela não vive fora do mundo. E como a Igreja é composta de homens e mulheres também vive internamente em um contexto de angustias e esperanças. É necessário também conhecer o contexto eclesial em que temos que viver e agir.

Igualmente, precisamos analisar o ministério diaconal na sua vivência e práxis atual, para perceber os apelos à nossa missão dentro do contexto social e eclesial.

O Documento de Aparecida elaborado dez anos atrás, nos apresentou uma análise da realidade da América Latina e o Caribe como um todo.  Esta análise permanece válida em muitos dos seus aspectos. Mas tanto no Continente como no Brasil nos encontramos com aspectos conjunturais novos. Tanto na análise social como eclesial nos defrontamos com situações e proposições novas constantes em outros documentos recentes do Magistério. São dados abundantes, precisos e preciosos sobre a realidade, tanto dos progressos e desafios da sociedade atual, como dos desafios e esperanças da Igreja.

  1. ASPECTOS DA SOCIEDADE ATUAL BRASILEIRA.

Neste início de século XXI a sociedade brasileira é impactada tanto pelos aspectos positivos como negativos de um mundo globalizado.

O mundo vive uma mudança de época, uma virada histórica, na qual vivemos um novo contexto social. A globalização impacta a cultura, a economia, a política, as ciências, a educação, esportes, artes, religião. O mundo vive sob a ditadura do capital financeiro. Vive uma crise ética global. Estamos na era do conhecimento e da informação. (Cf. EG 52). Vivemos a “globalização da indiferença” frente aos povos em guerra, com fome, explorados.

  1. Aspectos alegres e esperançosos da sociedade atual.

Muitos ainda acreditam que outro mundo é possível. Que outra sociedade é possível. Que outra forma de organização política, econômica, cultural é possível.

São como ilhas de esperança. Portos seguros de solidariedade. São muitos os movimentos e as organizações que alimentam uma utopia, um sonho, um projeto novo de vida para o planeta.

Surgem inúmeras comunidades, associações e grupos que são a esperança de que será melhor o dia de amanhã.

Quanta alegria para tantas pessoas e famílias graças aos avanços da medicina.

Quantas expectativas diante dos esforços pioneiros para vivenciar uma economia solidária.

Quantas alegrias pelos avanços propiciados nos campos da biologia e da genética.

“São tempos nos quais se constatam avanços e conquistas no mundo da ciência e da técnica, que proporcionam conforto e bem-estar. Constatam-se também avanços em vários âmbitos da sociedade: a promoção da mulher; a valorização das minorias étnicas; o destaque a justiça, a paz, e a ecologia; a consciência da importância dos movimentos sociais e dos direitos a educação e a saúde; iniciativas para a superação da miséria e da fome”. (Doc. CNBB, 102, n. 19).

  1. Aspectos tristes e graves que afetam a sociedade no Brasil.

Para esta parte da análise vou-me permitir citar amplamente um trabalho do Diác. Alder Júlio Calado, sociólogo e escritor: “Como poucas vezes em sua história, o Brasil vem enfrentando uma conjuntura ético-política e sócio-econômica das mais complexas e desafiantes.  (…)”.

Os índices oficiais de desemprego revelam-se aterradores: cerca de 12.3 milhões de desempregados!

(…) sucateamento dos serviços públicos essenciais (moradia, saneamento, saúde, educação, transporte público, segurança pública…).

(…) desinvestimento em políticas sociais essenciais, a exemplo da reforma agrária e da agricultura familiar, com pesadas consequências para a agroecologia, em contraste com o apoio e financiamento pelo Estado do hidro-agronegócio e das desastradas políticas de mineração e de manejo florestal.

Não menos danosa se tem mostrado a atual política de endividamento, da qual decorrem o vertiginoso crescimento da dívida pública e seus respectivos serviços, sem esquecermos a exorbitante lucratividade obtida pelo setor financeiro e pelas transnacionais que atuam nos setores estratégicos da economia brasileira.

Eis alguns traços de nossa economia, a indicarem um quadro tenebroso para a enorme maioria de nossa sociedade. Quadro fortemente alimentado pela cultura do desperdício e da corrupção sistêmica envolvendo altos setores empresariais, grandes empreiteiras, altos funcionários das empresas estatais e políticos de referência nacional, de modo a comprometer profundamente qualquer projeto de recuperação econômica de curto prazo.

Ainda na esfera econômica, este mesmo quadro sombrio é agravado por várias outras políticas econômica em curso, tais como a política tributária, a política trabalhista e a política previdenciária. Sobre a primeira “a tributária” recai a responsabilidade por uma marcante participação no aprofundamento da desigualdade social, à medida que por um lado isenta de impostos setores econômicos privilegiados cometendo em seu favor seguidos atos de renúncia fiscal e outros do gênero; por outro lado, penaliza os setores mais empobrecidos e a classe média seja afligindo-lhes pesada carga de impostos indiretos, seja atribuindo à classe média pesada carga do Imposto de Renda, por meio de uma taxação relativamente regressiva, isto é, os segmentos assalariados acabam pagando proporcionalmente mais do que os segmentos economicamente privilegiados.

No âmbito político, não são menos graves as injustiças e contradições imperantes, a começar pela atual organização político-partidária, marcada pela atuação nociva de dezenas de siglas partidárias (muitas delas conhecidas como “partidos de aluguel”), São, em grandíssima parte, partidos desprovidos de perfil ideológico, de compromissos programáticos republicanos, tendo como meta principal a de extrair vantagens, tais como fatias do fundo partidário, arrancar benesses, durante as campanhas eleitorais, em suas negociatas com os “grandes  partidos”, seja por meio de cessão de seu tempo de propaganda oficial de rádio e televisão, seja por meio de acordos inconfessáveis com setores partidários detentores de maiores chances de vitória eleitoral.

A isto se agrega um vício eleitoral recorrente, trata-se do financiamento espúrio, pelas grandes empresas e empreiteiras, de partidos e de candidatos, do que decorre a instalação de uma concorrência extremamente desigual em relação a partidos e candidatos ética e politicamente comprometidos com as classes populares, já durante a campanha eleitoral. Após esta, é apresentada, pelos financiadores aos “eleitos” a cobrança de compromissos com os interesses e prioridades, em projetos e votações ligados aos interesses de quem os financiou, pois, como diz o adágio popular, “Quem come do meu pirão, prova do meu cinturão”…

No plano estritamente ético da ação política, partidos de esquerda historicamente reconhecidos pela sua lisura (ficou marcada, por exemplo no imaginário popular brasileiro, a campanha intitulada “Ética na política”, protagonizada pelo PT, nos anos 90), passaram a descuidar-se deste compromisso e a resvalar em sucessivos casos de corrupção, em conluio com altos funcionários de empresas estatais e com grandes empreiteiras contratadas pelo Governo, para atuarem em obras públicas, especialmente na área de petróleo. A este respeito, tornaram-se famosos os casos julgados na Ação Penal 470 (mais conhecida como “Mensalão”) e o caso da Lava-Jato ainda em curso, em ambos os casos envolvendo diretamente grandes executivos empresariais, altos funcionários de empresas estatais, figuras operadoras do setor financeiro e lideranças políticas de vários partidos.

No plano mais diretamente cultural, importa acentuar, pelo menos, 2 elementos relevantes: Um, que incide no plano dos valores e outro correspondente ao da mídia comercial e das redes sociais. O primeiro elemento –o dos valores- põe a nu um nítido processo de degradação ética do tecido social, grandemente influenciado pelas atitudes eticamente comprometidas de lideranças históricas de referência. Tal processo de degradação pode ser atestado pelo comportamento cada vez mais distanciado de valores éticos almejados. Isto se materializa em exemplos do cotidiano, tais como: a compulsão por extrair vantagens e privilégio no portar-se a uma fila de banco, ao aguardar sua vez no atendimento hospitalar, ao conduzir-se no trânsito, ao aceitar acordos ilícitos de compra e venda de votos, ao privatizar espaço e recursos públicos, no âmbito de sua respectiva instituição de trabalho (privatizando tempo, recursos, materiais, equipamentos, etc..). Não se trata de insinuar que tal processo tenha sido desencadeado a partir destes últimos anos. De fato, aqui se trata de uma cultura que tem raízes históricas mais profundas. Sustentamos apenas que, nas últimas décadas, tal tendência se vem acentuando sobremaneira, graças às condições favoráveis aí encontradas.

Outro aspecto a merecer destaque, no plano cultural, prende-se à estruturação e ao funcionamento dos grandes meios de comunicação (jornal, rádio e televisão), bem como ao comportamento das chamadas redes sociais. No primeiro caso, tem-se toda uma vasta população refém da difusão e da recepção acrítica dos interesses e valores ideológicos de uma meia dúzia de jornais, de canais de rádio e televisão, monopolizados por uma dezena de famílias. Esdrúxula situação em curso, já há décadas, a contrastar com o que dispõe a Constituição brasileira, que define a exploração destes meios de comunicação como serviços submetidos ao interesse público, razão por que sua exploração se dá como uma concessão pelo Estado, ao qual cabe regular, acompanhar e avaliar sua qualidade social, podendo inclusive renovar ou não tal concessão.

Com relação às redes sociais, conta-se, por um lado, com uma conquista social a ser celebrada, no campo da comunicação, em razão de seu crescente alcance social, e, por outro lado, dadas as condições de escassa criticidade da enorme maioria dos seus usuários, elas acabam, por vezes, tornando-se uma faca de dois gumes: tanto podem servir aos interesses dos “de baixo”, como podem propiciar um uso perverso dessas ferramentas, como se costuma observar na frequente circulação de mensagens, imagens e vídeos com uma terrível carga de preconceitos e discriminações de classe, de gênero, de etnia, de procedência geográfica, etc., um quadro pantanoso a favorecer o desencadeamento de campanhas de alto teor misógino, homofóbico, racista, xenófobo, preconceituoso contra os presos, assim mantendo e ampliando, objetivamente, a grade de valores dominante.

A respeito deste último ponto, por exemplo, não é gratuito o espectro tenebroso do sistema prisional brasileiro, sobre o qual se tornou famosa uma declaração do Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, do Governo Dilma, de que preferia morrer a experimentar as condições desumanas do sistema prisional do Brasil… O mais recente drama de sucessivos massacres de presos, em alguns Estados do Brasil, só confirma este trágico espectro.

“Este é um desafio ingente, em especial, para as forças sociais comprometidas com mudanças estruturais, a exemplo dos movimentos sociais populares e de outras organizações de base”. ALDER JULIO FERREIRA CACADO, BRASIL – SOCIEDADE E IGREJA: Impasses, desafios e perspectivas, (14/02/2017).

Os últimos pronunciamentos da CNBB, e de alguns bispos, por ocasião do dia do trabalhador, nos mostram a necessidade de um compromisso sério na construção de uma sociedade mais justa e fraterna. “O dia do trabalhador e da trabalhadora é celebrado, neste ano de 2017, em meio a um ataque sistemático e ostensivo aos direitos conquistados, precarizando as condições de vida, enfraquecendo o Estado e absolutizando o Mercado. Diante disso, dizemos não ao “conceito economicista da sociedade”, que procura o lucro egoísta, fora dos parâmetros da justiça social” (Papa Francisco, Audiência Geral, 1º. de maio de 2013).

Nessa lógica perversa do mercado, os Poderes Executivo e Legislativo reduzem o dever do Estado de mediar a relação entre capital e trabalho, e de garantir a proteção social. Exemplos disso são os Projetos de Lei 4302/98 (Lei das Terceirizações) e 6787/16 (Reforma Trabalhista), bem como a Proposta de Emenda à Constituição 287/16 (Reforma da Previdência). É inaceitável que decisões de tamanha incidência na vida das pessoas e que retiram direitos já conquistados, sejam aprovadas no Congresso Nacional, sem um amplo diálogo com a sociedade.

Irmãos e irmãs, trabalhadores e trabalhadoras, diante da precarização, flexibilização das leis do trabalho e demais perdas oriundas das “reformas”, nossa palavra é de esperança e de fé: nenhum trabalhador sem direitos! Juntamente com a Terra e o Teto, o Trabalho é um direito sagrado, pelo qual vale a pena lutar (Cf. Papa Francisco, Discurso aos Movimentos Populares, 9 de julho de 2015).

Encorajamos a organização democrática e mobilizações pacíficas, em defesa da dignidade e dos direitos de todos os trabalhadores e trabalhadoras, com especial atenção aos mais pobres. (Carta da CNBB aos trabalhadores em 1º de maio 2017)

Dom Dimas, Arcebispo Metropolitano de Campo Grande – MS, ressalta como no atual sistema político e econômico as medidas que são tomadas pelo governo afetam principalmente aos mais carentes. “Vivemos tempos difíceis em nosso País, onde a retração da atividade econômica tem significado o fechamento de empresas e a supressão de postos de trabalho, com um aumento vertiginoso das taxas de desemprego nos últimos meses, deixando milhões de famílias inseguras e desesperançadas. A crise econômica atinge a todos, porém deixa ainda mais vulneráveis trabalhadores e trabalhadoras que dependem de seus salários para viver e não participam dos mecanismos do mercado financeiro para se proteger. A chamada política de austeridade financeira ou de ajuste fiscal, incluindo a extinção ou redução de programas sociais e de transferência de renda, impõe um ônus difícil de ser suportado pelos segmentos mais pobres e vulneráveis da população, uma vez que são os mais dependentes dos serviços públicos e das políticas sociais.

A Previdência Social do Brasil representa uma conquista do povo brasileiro e um Direito Social, garantido pela Constituição Federal. O sistema previdenciário precisa ser melhor avaliado, inclusive no que diz respeito ao tão falado “rombo” no seu orçamento, que tem sido motivo de diferentes posições dos estudiosos do assunto. Aliás, é urgente que se realize uma ampla auditoria da dívida interna e externa do Brasil, dos Estados e Municípios. No entanto, parece-me que a maneira como o problema está sendo enfrentado é bastante falho. Um projeto desta envergadura deveria ser mais discutido com a sociedade. E existem pressupostos éticos que devem contrabalançar uma análise baseada só em números, para evitar que justamente os mais vulneráveis sejam prejudicados em seus direitos.

O mesmo se diga da Lei da Terceirização e do Projeto de Reforma Trabalhista. Certamente, é necessário modernizar as relações de trabalho e gerar empregos. O trabalho dignifica o ser humano e o faz partícipe da obra da criação. A pessoa humana é sempre um fim em si mesma e nunca um meio. Não pode, portanto, ser reduzida à condição de mercadoria, o que traria inevitavelmente mais insegurança e fragilidades, sobretudo aos que vivem de trabalhos menos valorizados do ponto de vista salarial. Assim, a prática da terceirização das atividades profissionais, sobretudo quando exercida de forma demasiadamente capilar, tem significado a precarização das condições de trabalho, a diminuição dos salários em relação aos empregados formais e a maior incidência de acidentes de trabalho. (Carta aberta de Dom Dimas Lara Barbosa por ocasião do dia do trabalhador).

A CNBB em Nota Oficial da 55ª Assembleia Geral dos Bispos, nos sinaliza que estamos realmente vivendo um grave momento nacional que poderemos superar retomando o caminho da ética. “A Nota Oficial destaca que o Brasil é “um País perplexo diante de agentes públicos e privados que ignoram a ética e abrem mão dos princípios morais, base indispensável de uma nação que se queira justa e fraterna”. No texto, os bispos advertem: “Urge retomar o caminho da ética como condição indispensável para que o Brasil reconstrua seu tecido social. Só assim a sociedade terá condições de lutar contra seus males mais evidentes: violência contra a pessoa e a vida, contra a família, tráfico de drogas e outros negócios ilícitos, excessos no uso da força policial, corrupção, sonegação fiscal, malversação dos bens públicos, abuso do poder econômico e político, poder discricionário dos meios de comunicação social, crimes ambientais”. Nota Oficial da 55ª Assembleia Geral dos Bispos, sobre o Grave Momento Nacional, Aparecida, 03/05/2017.

O que mais entristece nesta sociedade é o individualismo pragmático e narcisista que torna insensíveis e alheios as necessidades dos outros.

É angustiante observar a inversão de valores existente na sociedade. Basta lembrar os milhões que são gastos nos cuidados com os cachorros, e o abandono em que são deixamos milhões de brasileiros.

Vivemos numa sociedade em que os indivíduos são escravos do consumo de coisas inúteis, desnecessárias. Daí as sobras, o lixo, o desperdiço, a poluição incontrolável.

A corrupção chegou a níveis insuportáveis. A corrupção generalizada corroeu todo o tecido social. Os grandes e os pequenos, os ricos e os pobres todos pensam e agem como corruptos.

Há um grande desencanto. Há uma forte falta de esperança, de expectativa. Não se quer imaginar que teremos futuro melhor. O desanimo paralisa. A sociedade é tomada por um pessimismo estéril. Por uma sensação de derrota.

A sociedade atual não quer saber de Deus. É uma sociedade secularizada. Para muitos a religião é um negócio. Para outros é uma forma alienada e alienante de sobreviver. Cada vez mais cresce uma religiosidade individualista sem compromisso com a transformação da sociedade.

Vivemos numa sociedade de morte. Assaltos, sequestros, acidentes de trânsito, balas perdidas, roubos a mão armada seguidos de assassinatos. Mais de 60.000 mortes violentas por ano. Média de 150 assassinatos por dia. O Brasil é o 8º país do mundo com mais suicídios. São mais de 10.000 por ano.

Vivemos numa sociedade pluralista, intolerante, fundamentalista, dominada por um sistema econômico capitalista neoliberal que gera desigualdade, desemprego, violência, injustiça, e deteriora, a passos cada vez mais rápidos, o meio ambiente.

Este é o contexto social em que temos que viver e agir.

  1. ASPECTOS ATUAIS DA IGREJA NO BRASIL.

Foi muito importante que o Documento de Aparecida fizesse uma análise também da própria Igreja. Como no caso da análise social, também como Igreja estamos em outro momento no Continente e no mundo. A nossa Igreja no Brasil vive aspectos peculiares e específicos.

Em Aparecida os bispos reconhecem que a pesar das deficiências e ambiguidades de alguns dos seus membros, ela teve e tem uma atuação junto aos pobres. Nos últimos anos houve um maior conhecimento da Bíblia, melhor catequese. Renovação da liturgia com esforços de inculturação. A dedicação de muitos presbíteros, o desenvolvimento do diaconado permanente. A grande quantidade de ministérios assumidos pelos leigos.

Mas também apontaram algumas sombras e desafio para a Igreja no Continente:

Desafios internos da Igreja:

  • O número de vocações sacerdotais e religiosas não acompanha o aumento da população.
  • Tentativas no interior da Igreja de voltar a uma eclesiologia e espiritualidade contrárias à renovação do Concílio Vaticano II.
  • A fraca vivência da opção pelos pobres.
  • O escasso acompanhamento aos leigos em suas tarefas de serviço à sociedade. Uma evangelização com pouco ardor e sem novos métodos e expressões, com ênfase no ritualismo, sem itinerário formativo.
  • A falta de aplicação da Doutrina Social da Igreja. Falta de presença no campo da cultura, no mundo universitário e na comunicação social. A falta de assistência às comunidades.
  • A desmotivação de sacerdotes frente ao vasto trabalho pastoral. A escassez de sacerdotes em muitos lugares (cf. DA 185).
  • Falta de comunhão de bens nas Igrejas locais e entre elas.
  • Não se assume suficientemente as pastorais sociais.
  • Falta uma sólida estrutura de formação dos agentes de pastoral.
  • Alguns movimentos eclesiais nem sempre se integram adequadamente na pastoral paroquial ou diocesana; ao mesmo tempo, algumas estruturas eclesiais não são suficientemente abertas para acolhe-los. (DA 100).
  • A Igreja deixa sem Eucaristia um número cada vez maior de comunidades.
  • Constata também o número dos que abandonaram a religião e dos católicos que deixaram a Igreja, indo para as seitas e outros grupos religiosos.
  • Reconhece que falta aos católicos em algumas ocasiões um estilo de vida conforme ao Evangelho. Assim como  falta coragem persistência e docilidade para continuar a renovação iniciada pelo Vaticano II e impulsionada pelas anteriores Conferências.

Desafios estruturais da Igreja:

  • Renovar a pastoral urbana.
  • Renovar a paróquia.
  • Resolver a falta e má distribuição dos presbíteros.
  • Resolver a questão da participação da mulher.
  • Resolver a questão ministerial.
  • Trabalhar com uma Pastoral Orgânica.
  • Que o pobre esteja no centro de todas as estruturas.

Transcorridos dez anos, cinco dos quais com o testemunho inquestionável do Papa Francisco e o seu lúcido magistério, hoje se ouvem vozes que dizem que a voz profética de Francisco é uma voz isolada. Que uma andorinha só não faz verão. Somos conscientes de que a grande maioria resiste as mudanças; vivemos numa Igreja santa e pecadora. Somos conscientes também de que os sopros proféticos e renovadores do Papa Francisco são sopros do Espírito Santo.

A proposta eclesiológica do Papa Francisco, é fundamentalmente a proposta contida no Documento de Aparecida.

Uma Igreja missionaria, pobre, misericordiosa, em renovação e diálogo.

Ele quer uma Igreja “em saída” e nos convida a “sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”. (EG 20). Sair “sem demora, sem repugnâncias e sem medo”. (EG 22).

Deseja uma Igreja pobre para os pobres. (EG 198). Que não fique a margem da luta pela justiça. (EG 184)

O Papa sonha com uma revisão-reforma-renovação-transformação da Igreja que seja feita logo e sem medo e que transforme tudo: costumes, estilos, horários, linguagem e toda a estrutura eclesial. (Cf. EG 27). E para esta tarefa convida a todos para serem ousados e criativos. (Cf. EG 33). Ele quer uma igreja “descentralizada”. Porque toda “centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da Igreja e a sua dinâmica missionaria”. (EG 32).

Uma Igreja “lugar da misericórdia gratuita”. (Cf. EG 114). “Onde todos possam sentir-se acolhidos, amados, perdoados e animados a viverem segundo a vida boa do Evangelho”.

  1. Alegrias e esperanças da Igreja no Brasil.

A Igreja no Brasil, desde o Concilio Vaticano II até hoje, vem propondo reflexões e ações para uma evangelização que responda aos apelos do Espírito no nosso tempo.

Nesta Igreja “não faltam sinais de esperança. Constata-se o avanço do trabalho de leigos e leigas na Igreja e na sociedade; ministros ordenados e membros da vida consagrada se dedicam com ardor a missão; comunidades respondem aos novos desafios; setores de juventude se organizam; crescem movimentos, associações, grupos, pastorais e serviços”. (DGAE 2015-2019 n. 28).

Uma grande esperança são as “Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil”. Ali são indicadas as urgências da ação evangelizadora e as perspectivas de ação, para que as igrejas particulares adaptem e concretizem nos seus contextos. (Documento da CNBB 102).

Alguns dos últimos documentos da CNBB mostram quais são as esperanças da Igreja no Brasil. A esperança de que aconteça uma conversão pastoral da paróquia, no documento número 100.

A esperança de que os cristãos leigos e leigas sejam “sal da terra e luz do mundo” (Mt 5, 13-14) com sua atuação na Igreja e na sociedade, no documento 105.

A alegria de ver a cada ano tantos gestos concretos de solidariedade se realizarem provocados pelos temas da Campanha da Fraternidade. Situações gritantes na nossa sociedade: terra, água, segurança pública, juventude, saúde pública, tráfico humano, Amazônia, biomas brasileiros.

O ministério diaconal é uma grande alegria e uma enorme esperança da Igreja no Brasil, por sua presença nas periferias e por seu testemunho de serviço gratuito.

As comunidades eclesiais de base, e tantas outras novas comunidades são uma esperança de renovação na missão.

E a mais recente esperança as orientações sobre a iniciação à vida cristã, que busca inspirar a Igreja no Brasil a repensar uma nova forma de fazer a catequese mais integrada com a liturgia, que leve a experimentar o encontro com Cristo. (Aprovado pela 55ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), realizada em Aparecida (SP) de 26 de abril a 5 de maio de 2017).

  1. Angústias e tristezas da Igreja no Brasil.

As Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2015-2019, Documentos da CNBB 102, no n. 26, recolhe sinteticamente os principais aspectos que requerem ser superados pela Igreja. “No âmbito católico um considerável número de pessoas se afasta, por diferentes razões, da comunidade eclesial, sinal “da crise de compromisso comunitário” (EG, título ao cap. II). Constata-se, em algumas comunidades, situações que interpelam a ação evangelizadora:

a persistência de uma pastoral de manutenção em detrimento de uma pastoral decididamente missionária;

a compreensão da comunidade como mera prestadora de serviços religiosos, mais do que lugar de vivencia fraterna da fé;

 a passividade do laicato, em vez de engajamento nas diversas instancias da vida social;

 a concentração do clero em determinadas áreas, mais do que a efetiva solidariedade eclesial;

a tendência de centralização excessiva, mais do que exercício da comunhão e participação;

sinais de apegos a “vantagens e privilégios”, mais do que espirito de serviço;

celebrações litúrgicas que tendem mais à exaltação da subjetividade do que a comunhão com o Mistério;

a utilização de uma linguagem inadequada, em vez de uma linguagem acessível e atual;

 tendência à uniformidade, mais do que a busca da unidade na diversidade.

 Sente-se a necessidade de encontrar uma nova figura de comunidade eclesial, acolhedora e missionária”.

Hoje um dos grandes desafios é iniciar um processo de renovação das paróquias. Dificilmente encontramos paróquias onde ao menos um pequeno grupo de fiéis esteja refletindo sobre como efetivar ações que realmente levem a uma renovação da comunidade paroquial.

Percebe-se um retrocesso no profetismo. O centro da pregação e das ações nas comunidades e paróquias não é o projeto de Jesus de construir uma sociedade mais fraterna e humana.

Notamos também um esfriamento do espirito colegial, sinodal e da corresponsabilidade.  Tudo continua muito centralizado ainda nos presbíteros. As decisões são tomadas nas reuniões do clero; e nos seus diversos conselhos clericais sem participação dos fiéis. Ainda respiramos um clericalismo muito forte alimentado por uma espiritualidade desencarnada e elitista.

A opção pelos pobres e necessitados ainda é algo muito estranho nos planos pastorais diocesanos e paroquiais. Pelo contrário sentimos uma volta aos cuidados excessivos com a liturgia e com todo o que envolve a beleza do templo.

Damos a impressão de paróquias e comunidades com medo e receio de um envolvimento maior com os movimentos populares. Reivindicar condições de vida digna e humana parecem que não fazem parte do projeto humanizador de Jesus.

Continuamos com uma precária assistência as comunidades do campo e das periferias porque, entre outras coisas, continuamos considerando os leigos como ovelhas e não como protagonistas. E o investimento em catequese e formação permanente continua sendo mínimo.

Este é o contexto eclesial em que temos que viver e agir.

  1. APELOS AO MINISTERIO DIACONAL FRENTE A SITUAÇÃO SOCIAL E ECLESIAL.
  1. Apelos frente a situação social.

Nossa missão é evangelizar, isto é, tornar o Reino de Deus presente no mundo. Colaborar com a ação libertadora do Espírito Santo.

“Na medida em que Ele conseguir reinar entre nós, a vida social será um espaço de fraternidade, de justiça, de paz, de dignidade para todos. Por isso, tanto o anúncio como a experiência cristã tendem a provocar consequências sociais. Procuremos o seu Reino: “Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais vos será dado por acréscimo” (Mt 6,33). O projeto de Jesus é instaurar o Reino de seu Pai; por isso pede aos seus discípulos: “Proclamai que o Reino do Céu está perto” (Mt 10,7). (EG 180).

Cuidai de “todos os homens e do homem todo” (PP 14). Sejamos concretos. Cuidemos de todas as dimensões da existência, de todas as pessoas. Trabalhemos pela promoção integral de cada ser humano. Não fiquemos nas sacristias. Vivenciemos uma religião com incidência na ordem social e na consecução do bem comum.

“Não releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocupar com a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciar sobre os acontecimentos que interessam aos cidadãos”. (EG 183).

Nós diáconos temos que influenciar a vida social e nacional com nossa vida, nosso testemunho, nossa pregação. Deveríamos ter um grande desejo de mudar o mundo, de transmitir valores, de deixar um legado de bondade para as futuras gerações. Nós diáconos “não podemos nem devemos ficar à margem na luta pela justiça” DCE (EG 183).

“Cada cristão [cada diácono] e cada comunidade são chamados a ser instrumentos de Deus ao serviço da libertação e promoção dos pobres”. (EG 187) “Os cristãos [os diáconos] são chamados, em todo o lugar e circunstâncias, a ouvir o clamor dos pobres”. (EG 191). Ficar surdos ao clamor dos pobres, nos coloca fora da vontade de Deus e torna-se para nós um pecado.

“Todos nós, cristãos, [diáconos], somos chamados a cuidar da fragilidade do povo e do mundo em que vivemos”. (EG  216).

O sinal que indica se não somos diáconos alienados e se estamos vivendo um autêntico ministério diaconal é se fizemos opção pelos últimos, por aqueles que a sociedade descarta e lança fora. (EG 195-196).

Neste momento somos chamados a ser homens do diálogo social. Homens abertos ao diferente. “… existem sobretudo três campos de diálogo onde a Igreja deve estar presente, (…) o diálogo com os Estados, com a sociedade – que inclui o diálogo com as culturas e as ciências – e com os outros crentes que não fazem parte da Igreja Católica”. (EG 238).

No contexto em que vivemos é necessária uma voz profética que defenda a dignidade da pessoa humana e o bem comum.

“As reivindicações sociais, que tem a ver com a distribuição de renda, a inclusão social dos pobres e os direitos humanos não podem ser sufocados com o pretexto de construir um consenso de escritório ou uma paz efêmera para uma minoria feliz. A dignidade da pessoa humana e o bem comum estão por cima da tranquilidade de alguns que não querem renunciar aos seus privilégios. Quando estes valores são afetados, é necessária uma voz profética”, (EG 218).

Temos que viver a verdadeira fé. Assim se expressou o Papa Francisco na homilia durante a celebração eucarística no Cairo, dia 29 de abril de 2017. “A fé verdadeira é a que nos torna mais caridosos, mais misericordiosos, mais honestos e mais humanos; é a que anima os corações levando-os a amar a todos gratuitamente, sem distinção nem preferências; é a que nos leva a ver no outro, não um inimigo a vencer, mas um irmão a amar, servir e ajudar; é a que nos leva a espalhar, defender e viver a cultura do encontro, do diálogo, do respeito e da fraternidade; é a que nos leva a ter a coragem de perdoar a quem nos ofende, a dar uma mão a quem caiu, a vestir o nu, a alimentar o faminto, a visitar o preso, a ajudar o órfão, a dar de beber ao sedento, a socorrer o idoso e o necessitado (cf. Mt 25, 31-45). A verdadeira fé é a que nos leva a proteger os direitos dos outros, com a mesma força e o mesmo entusiasmo com que defendemos os nossos. Na realidade, quanto mais se cresce na fé e no seu conhecimento, tanto mais se cresce na humildade e na consciência de ser pequeno. ”

  1. . Apelos frente a situação eclesial.

Dentro desse contexto de Igreja, como viver o ministério diaconal de forma coerente? Como ser agentes da mudança estrutural, pastoral e espiritual? Como sair de uma pastoral meramente de manutenção?

Diria em primeiro lugar que devemos ter a coragem de não deixar as coisas como estão. (Cf. EG 25). “Ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”. (EG 20). Ter a coragem de tomar a iniciativa, de envolver-se com o povo. (Cf. EG 24).

Frente a urgente necessidade de uma renovação das paróquias, o que fazer? Os diáconos, na sua grande maioria, trabalham nas paróquias. Não podemos simplesmente ficar como expectadores, passivos, suportando, pensando que não tem jeito. Pensando que só é possível mudar alguma coisa só quando houver uma mudança do pároco. Temos que superar os medos de falar, de manifestar o nosso inconformismo, de expor as nossas ideias, de propor algo novo. Sem nos preocupar se será aceito ou não. Se será rejeitado. Se seremos incompreendidos. Não podemos ser omissos.

Devemos insistir para que nas nossas paróquias e comunidades Jesus seja o foco principal e o centro de toda a nossa vida. “A Igreja deve levar a Jesus. Este é o centro da Igreja: levar a Jesus. Se alguma vez acontecesse que a Igreja não levasse a Jesus, seria uma Igreja morta”. (Papa Francisco, Homilia em Santa Marta, 23 de outubro de 2013). A centralização no presbítero, no diácono, em algum agente de pastoral desvia da autentica experiência de vida em Cristo.

Propor ações fora do templo. De um cunho mais social e humano para sinalizar melhor em que consiste a construção do Reino de Deus.

Frente a falta de profetismo é urgente conscientizar de que pelo batismo nos tornamos também profetas. De que Jesus foi o maior dos profetas. Que Ele como profeta anunciou a Boa Notícia de Deus e por meio de muitos sinais mostrou que veio para construir um mundo mais justo e solidário. “Temos de desenvolver muito mais a indignação profética das comunidades cristãs”. (PAGOLA, p. 29, 2015)

Frente a débil opção pelos pobres, insistir que na paróquia são eles que devem ocupar a nossa atenção principal. Que é para eles que devemos programar as nossas atividades. Que são eles que nos ensinam a viver o Evangelho. Sem esta linha de ação as paróquias estão fadadas ao fracasso.

“E qualquer comunidade da Igreja, na medida em que pretender subsistir tranquila sem se ocupar criativamente nem cooperar de forma eficaz para que os pobres vivam com dignidade e haja a inclusão de todos, correrá também o risco da sua dissolução, mesmo que fale de temas sociais ou critique os Governos. Facilmente acabara submersa pelo mundanismo espiritual, dissimulado em práticas religiosas, reuniões infecundas ou discursos vazios”. (EG 207).

O nosso ministério diaconal deve estar totalmente voltado para a edificação de paróquias e comunidades samaritanas. Comunidades, compassivas, misericordiosas, em contato com as feridas da humanidade. “Jesus quer que toquemos a miséria humana, que toquemos a carne sofredora dos outros”. (EG 270).

Frente as comunidades do campo e das periferias das cidades que estão abandonadas, não só devemos os diáconos optar preferencialmente por ir e trabalhar nelas, como também devemos encorajar para que cada vez mais leigos e pequenas comunidades ou grupos se voltem para uma ação evangelizadora nestas áreas. As comunidades de periferias não são apenas as geográficas. Existem as “periferias existenciais” que requerem a atenção e dedicação de todos aqueles que conscientemente são discípulos e discipulas de Jesus.

Frente a decadência do espirito sinodal, colegial e de corresponsabilidade, somos convocados a promover assembleias, encontros, conselhos, grupos de trabalho, em todas as instancias que tenham voz e voto e que se envolvam em todas as etapas do processo da realização das decisões.

Frente a uma pastoral de manutenção somos chamados a colaborar para criar uma nova mentalidade. Todos devem entrar no processo de abandonar as ultrapassadas estruturas que já não favoreçam a transmissão da fé . (CF. DAp. 365). Fazer ver as pessoas que não adianta mais continuar a fazer as mesmas coisas, com as mesmas pessoas, nos mesmos horários. Mesmo que pareçam costumes centenários irremovíveis. Ir substituindo progressivamente práticas de piedade “inócuas”, por ações misericordiosas que nos ajudem depois a celebrar, na liturgia verdadeira, a vitória da ressurreição de Cristo sobre todos os sinais de morte.

 

  1. ASPETOS ATUAIS DO MINISTERIO DIACONAL NO BRASIL.

Quem olha para a caminhada do ministério diaconal no Brasil desde o Concilio Vaticano II até hoje, pode perceber que houve um crescimento em todos os sentidos. Porém junto com o crescimento se apresentam também novas situações e desafios.

Percebo seis grandes desafios para o diaconado no momento atual.

  • Construir um vínculo afetivo e efetivo bispo-diácono.
  • Articular o corpo diaconal e fortificar a comunhão diaconal.
  • Aprofundar uma específica formação inicial e permanente.
  • Crescer na vivencia da própria e peculiar espiritualidade diaconal.
  • Capacitar para ser agentes de renovação da Igreja.
  • Resgatar o espírito profético de Jesus.
  1. Alegrias e esperanças do ministério diaconal.

Sem dúvidas ao longo desta caminhada cinquentenária o ministério diaconal ajudou a revigorar o testemunho de uma Igreja servidora.

Colaborou para ampliar os campos de atendimento aos excluídos, animando as diferentes pastorais sociais e centros de ação social seja nas paróquias ou a nível diocesano.

Também contribuiu na animação e formação de agentes que trabalham nas pastorais sociais. Nos cursos de formação Fé e Política.

A grande contribuição para a catequese sobre tudo na catequese de perseverança e de adultos.

Os benefícios para toda a Igreja das celebrações da Palavra nas comunidades mais distantes. As celebrações de batizados e matrimônios. O grande consolo as famílias por ocasião das exéquias.

A ajuda aos presbíteros não só em tarefas, mas como conselheiros e amigos.

O equilíbrio em alguns presbitérios mais fechados, trazendo as inquietações dos fiéis.

Grande contribuição de homens maduros e experientes, não só como homens de fé e de grande amor a Igreja, mas também como profissionais qualificados.

Uma das grandes esperanças é que possa se desenvolver mais a criação de diaconias. Uma alternativa criativa de comunidade sem seguir os moldes tradicionais das paroquias.

  1. Sombras e dificuldades do ministério diaconal.

O ministério diaconal no Brasil é um ministério de contrastes, como a sociedade brasileira e a Igreja no Brasil. Diáconos muito ricos e diáconos muito pobres sem uma efetiva comunhão de bens e uma partilha fraterna.

De um lado há uma exigência muito grande de estudos, não tanto de formação, e de outro há situações de extrema penúria formativa.

De um lado diáconos com um enxoval de túnicas, estolas, dalmáticas e malas de rituais e utensílios litúrgicos, frente a outros que não conseguem nem os mais simples dos paramentos.

Infelizmente, a pesar dos bons frutos já produzidos, o diaconado tem pouca ou quase nenhuma incidência na transformação da sociedade e muito menos na renovação da Igreja.

O ministério diaconal vivencia, como a sociedade e a Igreja, uma assustadora crise de espirito comunitário; ir ao encontro dos irmãos, participar das reuniões. Encontros, retiros, assembleias dos próprios diáconos tornou-se cada vez mais uma dificuldade quase instransponível, debilitando a comunhão afetiva e efetiva entre os irmãos diáconos, que sem diálogo e partilha de vida, de experiências, são facilmente alvo de iniciativas de presbíteros que nem sempre entendem nem tem conhecimento do que seja o ministério diaconal.

O que se constata, com tristeza, é cada vez um maior número de diáconos realizando tarefas nas paróquias, mas não uma ação evangelizadora. Muito funcionário e pouco missionário.

Aquilo que mais nos entristece é constatar que a maioria dos diáconos não tem um efetivo engajamento nas pastorais sociais e muito menos estão interessados, ou sentem inquietação para animar e formar os agentes de pastoral social.

Vemos como muito perigosas as reivindicações de alguns para receber salários fixos das paroquias ou das dioceses, e exigir pagamento por todo serviço realizado, porque isto cria uma dependência que aliena a capacidade de crítica, e por outro lado criam-se relações pouco evangélicas entre “patrão e empregado”.  Por outro lado, nos sentimos envergonhados quando constatamos que alguns presbíteros querem explorar o trabalho pastoral dos diáconos sem nenhum respeito nem valorização dos seus serviços.

Uma grande dificuldade que enfrenta o diaconado no Brasil é a deficiência endêmica na articulação dos seus membros em todos os níveis: diocesano, regional e nacional. Parece inacreditável que na sociedade da internet, do watsapp, etc, estejamos tão isolados, cada um no seu pequeno mundo. Num mundo tão interligado quão pouco nos conhecemos e quão pouco estamos unidos. Já dizia Bento XVI que a facilidade na comunicação no mundo moderno, nos aproxima, mas não nos torna mais irmãos.

A deficiência na articulação é também sinal da deficiência de autênticas lideranças. Isto é muito grave também desde o lado pastoral do diácono.

Parece que nos últimos tempos assistimos a uma progressiva separação entre presbíteros e diáconos. Muitos bispos alegam que as reuniões do clero são em horários inconvenientes para os diáconos por motivo de trabalho. Noutros casos porque o número de diáconos é superior ao dos presbíteros. Também se separam os retiros. Retiros para presbíteros, retiros para diáconos. Nos esquecemos que aquilo que nos une é muito mais significativo do que aquilo que nos diferencia. Desta forma vamos criando dois cleros. Vamos distanciando. Vamos voltando a antigas práticas de clericalizarão, de casta, de hierarquia, de superiores e inferiores.

Constatamos perplexos os vazios pastorais existentes nas novas fronteiras geográficas e culturais da missão da Igreja. O mundo das comunicações, a construção da paz, o desenvolvimento e a libertação dos povos, sobretudo das minorias, a promoção da mulher e das crianças, a ecologia e a proteção da natureza, o campo da experimentação científica, das relações internacionais. (Cf. DAp 491). São necessárias iniciativas nestes campos de evangelização.

  1. Apelos aos diáconos frente a situação do ministério diaconal no Brasil.

Irmãos, colaboremos com o diaconado no Brasil. Colaborar com o diaconado é colaborar com o projeto de Deus. Deus suscitou pelo seu Espirito este ministério na Igreja para a realização da missão da Igreja nestes tempos.

Colaborar com o diaconado significa rezar pelos diáconos; contribuir com o nosso tempo e com nossos recursos e dons para que o diaconado realize fielmente a sua missão; significa promover as vocações diaconais; significa dar testemunho de dedicação pastoral generosa e gratuita. Significa tomar a peito a formação inicial e permanente.

Trabalhemos para estabelecer uma relação afetiva e efetiva com os nossos bispos. Não se entende que o diácono “orelha, boca, coração e alma do bispo” segundo a Didascália dos Apóstolos, não tenha uma proximidade e uma intimidade e amizade capaz de gerar propostas novas para as novas necessidades da evangelização.

Para aqueles bispos mais preocupados com a administração e as finanças, o ministério diaconal não oferece muitas vantagens econômicas, pois os diáconos não produzem recursos como as paróquias. É chegada a hora de não ver e medir tudo pelo lado econômico. A renovação pastoral está exigindo que procuremos em primeiro lugar o Reino de Deus, pois o resto virá por acréscimo.

Acreditemos que podemos colaborar com os nossos bispos em iniciativas pastorais criativas, diferentes, que ajudem as nossas dioceses a adquirir um rosto mais parecido com o rosto de Jesus; muito mais identificadas com o projeto de Jesus; muito mais samaritano.

Não deixemos que nos roubem a comunidade diaconal. Esta expressão do Papa Francisco na Evangelli Gaudium, 92 inspira um grande questionamento para o ministério do diácono.

A referida expressão nos leva a refletir sobre a crise comunitária que vive o diaconado. No primeiro encontro dos ex-presidentes da CND, realizado em setembro de 2016, constatamos com pesar, que há uma enorme desmotivação dos diáconos para participar dos encontros diocesanos e regionais.Ora, nós mesmos estamos destruindo a nossa comunidade diaconal.  Sejamos construtores da comunidade. Quem não participa dos encontros organizados pelas Comissões Diocesanas ou Arquidiocesanas de Diáconos, está colaborando para enfraquecer e destruir um organismo de comunhão e fraternidade. Um organismo que nos ajuda a fortalecer nossa espiritualidade e nossa formação para o ministério. Ninguém consegue se sustentar vivendo isolado. Só quem tem espírito comunitário, espírito trinitário, é capaz de ser animador e construtor de comunidades. Quem vive acomodado, não tem espírito missionário para sair ao encontro das comunidades das periferias. Os encontros diocesanos de diáconos e esposas são fonte de renovação, de ânimo, que nos ajudam a fortalecer o nosso compromisso ministerial. Se vivermos bem o espírito da comunidade diocesana de diáconos, isto se refletirá na participação nas atividades do regional e do nacional.

Deixemo-nos conduzir pelo Espirito Santo. Ele nos ajudará a viver uma autentica espiritualidade diaconal. A viver o serviço até dar a vida, como Jesus. A verdadeira espiritualidade diaconal só é possível ser vivida, estando próximo da vida das pessoas, penetrando no coração do povo. (Cf. EG 268).

Sejamos homens inseridos a fundo na sociedade, partilhando a vida com todos, ouvindo as suas preocupações, colaborando material e espiritualmente nas suas necessidades, alegrando-nos com os que estão alegres, chorando com os que choram e comprometendo-nos na construção de um mundo novo, lado a lado com os outros. (Cf. EG 269).

Peçamos ao Espírito Santo, Ele que renova todas as coisas, para que infunda em nós um espírito renovador; que nos dê coragem para enfrentar as mudanças e nos dê o mesmo espírito profético de Jesus.

Conclusão.

Diante do contexto social e eclesial em que temos que viver e agir, diante da situação do diaconato no Brasil, revela-se como o autêntico diácono, aquele que decidiu, no mais íntimo de seu ser, estar com os outros e ser para os outros. (Cf. EG 273).

 

Tomado de: cnd.org

Foto: Diácono José Bezerra de Araújo – ENAC / CND

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