Diaconado Permanente, Vocação e Missão do passado para o futuro. Arcebispo de Palmas, Brasil

Tenho diante dos meus olhos e entre as minhas mãos, o pedido para escrever um breve artigo sobre os cinquenta anos da restauração do diaconado permanente. Todos sabem que o ministério diaconal remonte ao tempo dos apóstolos e, portanto, é um dos ministérios apostólicos. Existem muitos textos bíblicos que testemunham e confirmam a sua existência, a sua origem e a sua prática no cristianismo nascente (At 6,1-6; 1Tm 3,8-13; 2Ts 3,8ss; Fl1,1).
Quando lemos as exitosas missões de Estevão (At 6,7-7,60) e de Filipe (At 8,4-23.26-40) – um pela morte e outro pela atividade missionária -, damo-nos conta da importância deste ministério na vida e na missão da Igreja de ontem, de hoje e se sempre. Nestes, relatos, três qualidades ou virtudes são destacadas nestes diáconos: homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria (At 6,3). O Espírito Santo não depende de nós: é dádiva, graça e dom. A sabedoria, no entanto, depende de nós: é adquirida e cultivada pela formação da mente e do coração. E a boa reputação é decorrência das duas anteriores. Dom, sabedoria e boa reputação juntos, transformaram e fizeram destes homens testemunhas exemplares do ministério diaconal de ontem, de hoje e do futuro.
O testemunho, a pregação e a morte de Estevão, em pleno exercício do ministério diaconal, dão a este ministério nascente contornos teológicos imensuráveis. Estevão é arrastado ao Sinédrio como Jesus no Calvário. Como Jesus, exaltado e vitorioso, contemplando o Pai, morre Estevão, contemplando a Jesus. Assim morre o primeiro diácono da história do cristianismo, cognominado de protomártir. É por isto que os diáconos, desde cedo, foram considerados “diáconos dos mistérios de Jesus Cristo”.
Os sinais e prodígios da vocação e missão, seja de Estevão ou de Filipe, se deram no limiar, na encruzilhada e no entorno das fronteiras existenciais, culturais e ambiental. Desta forma, os dois bem que poderiam servir de medidas e de modelos programáticos e paradigmáticos para a vocação e a missão do ministério diaconal nas “fronteiras”, nos “aerópagos” e nos “pátios dos gentios” da vida. Ontem como hoje, há muitos eunucos que percorrem nossas estradas, nossas praças, nossos campos e nossas cidades, a procura de quem os expliquem as Escrituras e os batizem. A estrada que desce de Jerusalém à Gaza ainda está deserta. A carruagem ainda está à espera de quem dela se aproxime. Há, portanto, ainda um longo caminho a percorrer no campo da diaconia.
Hoje quando afirmando que o diaconado permanente foi o ministério das periferias e fronteiras do passado, estamos afirmando também que serão no presente e no futuro: “os diáconos permanentes são ordenados também para acompanhar a formação de novas comunidades eclesiais, especialmente nas fronteiras geográficas e culturais”. Quando reflito sobre algo desta natureza, me recordo das palavras do para Francisco, especificamente sobre a formação presbiteral, dirigidas aos bispos brasileiros, com destaque aos bispos amazônicos, como eu: “Eu gostaria de acrescentar que deveria ser mais incentivada e relançada a obra da Igreja. Servem formadores qualificados, especialmente professores de teologia, para consolidar os resultados alcançados no campo da formação de um clero autóctone, inclusive para se ter sacerdotes adaptados às condições locais e consolidar, por assim dizer, o rosto amazônico da Igreja”. E acrescentou: “Uma Igreja como a que está no Brasil, que é um grande mosaico de ladrilhos, de imagens, de formas, de problemas, de desafios, mas que, por isso mesmo, é uma enorme riqueza. A Igreja não é jamais uniformidade, mas diversidades que se harmonizam na unidade. E isso é válido em toda a realidade eclesial”. E finalmente disse: “Arrisquem! Não tenham medo de arriscar. Se vocês não se arriscarem, já estarão errados”. Que leitura poderemos então fazer destas sábias palavras do papa Francisco para o diaconado permanente na Igreja do Brasil, na comemoração dos cinquenta anos de sua restauração?
Primeiro, “isto é válido em toda a realidade eclesial: a Igreja, como um grande mosaico de ladrilhos, de imagens, de formas, de problemas e de desafios que se harmonizam na unidade”, bem que poderia justiçar a necessidade da harmonia dos ministérios ordenados: o ministério diaconal, ao lado do ministério presbiteral, nas comunidade eclesiais, especialmente naquelas não satisfatoriamente atendidas pastoralmente.
Segundo, “um clero autóctone, adaptado às condições locais, como rosto amazônico”: se até o ministério presbiteral, que sempre teve uma configuração teológica mais complexa, é possível existir autoctamente e com rosto inculturado, o que não dizer do diaconado permanente que tem uma configuração teológica bem mais simples?
Terceiro, “arrisquem-se! Se não arriscarem já estão errados”: estamos então incorrendo num erro, pois, não estamos arriscando e nem sendo ousados. Não existe nada mais capaz de derrubar as barreiras das estruturas caducas, que já não mais evangelizam, do que a missão. Nas curvas dos caminhos das mudanças de épocas, a rigor, a Igreja nem precisaria de diáconos permanentes. Bastaria ter missionários diáconos.
Mas, onde se encontram estas novas periferias para o exercício missionário do diaconado permanente? No mundo da comunicação, nos aglomerados, nos condomínios fechados, nos hospitais, nos asilos, nos abrigos, nos lugares de lazer e de turismo, nas prisões, no mundo da ecologia e na proteção da natureza e, sobretudo, nos corações. “A missão da Igreja é para o coração das pessoas”, como disse o papa Francisco: “a missão não é apenas uma questão de territórios geográficos, mas de povos, culturas e pessoas individuais, precisamente porque as fronteiras da fé não ultrapassam somente lugares e tradições humanas, mas o coração de cada homem e de cada mulher”.
Portanto, na comemoração dos cinquenta anos de restauração do diaconado permanente, faz-se necessário, valorizar ainda mais a vocação e a missão, a graça e o carisma do diaconado permanente. Não mais tê-lo para enfeitar altar ou para substituir padre, mas para a criação e a edificação da Igreja nas novas periferias e fronteiras. Para tanto, é preciso que as sementes deste precioso dom encontrem terrenos favoráveis, a fim de que possam germinar e produzir frutos. Estes terrenos devem ser adubados e fertilizados com o corretivo da conversão pastoral. Sem isto, é como colocar remendo novo em pano velho, vinho novo em odre velho (Lc 5,36-37). Foi este o terreno que levou a Igreja primitiva a escolher homens de boa reputação, repletos do Espírito Santo e de sabedoria.
É neste sentido que afirmo que o ministério diaconal é o ministério do passado para o futuro: um pequeno, mas eficaz sinal de esperança para a profecia de uma Igreja, comunidade de comunidades. Parabéns e muita festa para comemorar os cinquenta anos de restauração deste ministério do passado para o futuro.
Dom Pedro Brito Guimarães, arcebispo de Palmas, TO

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